Sumário

Sumário do livro Estereótipos



Apresentação	
1.1. A história	
1.2. Conceitos básicos
1.3. Noções adicionais
1.4 Premissas e fundamentos
1.5. O plano da obra

2. Os estereótipos na história	
2.1.Uma dificuldade decisiva	
2.2.Antes da história: sobre explosões, galáxias, humanos e sociedades
 2.2.1.Era cosmolóragica	
 2.2.2.Era cambriana	
 2.2.3.Primatas	
 2.2.4.Hominídeos	
 2.2.5.Era do sapiens	
 2.2.6.A grande viagem	
2.3.Uma breve digressão histórica	
 2.3.1.Sociedades tradicionais	
 2.3.2.Mundo antigo	
   Ambientes, tipos humanos e hierarquias
   Os estereótipos na Antiguidade	
   Conclusões sobre os estereótipos na idade antiga	
 2.3.3.Mundo medieval	
   Identidade e imagens nacionais	
   Os estereótipos e o conhecimento	
   Classificações e taxionomias	
   Novas categorias	
   Raça e sangue	
   Conclusões sobre os estereótipos no período medieval	
 2.3.4.Período moderno	
   Navegações e descobertas	
   Colonizar	
   Escravizar
   Iluminar	
   Conclusões sobre os estereótipos no período moderno
 2.3.5.Mundo contemporâneo	
   Ciência, raça e tipos humanos	
   Exposições e zoológicos	
   Uma mãozinha para a natureza	
   A afirmação da raça	
   Conclusões sobre os estereótipos no período contemporâneo
2.4. O que a história pode nos ensinar acerca dos estereótipos?	

3. O estudo científico dos estereótipos		
3.1.O modelo atitudinal: uma antiga concepção ainda prevalente	
3.2.O período atitudinal: das descrições à metáfora da distorção (1920-1970)
   3.2.1.Continuidades e desdobramentos
   3.2.2.Ajustes e aperfeiçoamentos	
   3.2.3.Das descrições à procura de uma teoria
   3.2.4.Em direção a modelos mais elaborados	
   3.2.5.Das descrições às teorias: dificuldades e alternativas	
   3.2.6.Os estereótipos nos anos 1960: mudanças e transformações	
   3.2.7.Os estereótipos em um mundo marcado por conflitos	
   3.2.8.Os estudos sobre os estereótipos no final do período atitudinal		
3.3. Em busca de teorias unificadoras	 
 3.3.1.Perspectivas individualistas: a cognição social	
   3.3.1.1.A ênfase no método	
 3.3.2.Perspectivas contextualistas: estereótipos, relações intergrupais e ameaças	
   3.3.2.1.Categorização social	
   3.3.2.2.Identidade social	
   3.3.2.3.Autocategorização	
   3.3.2.4.Ameaças reais e percebidas	
3.4. Especialização e múltiplos níveis	
 3.4.1.Evolução e genética	
 3.4.2.Sistemas neurais e endócrinos	
 3.4.3.Processos psicológicos	
   3.4.3.1.Do mundo justo à legitimação do sistema	
   3.4.3.2.Gerenciamento do terror	
   3.4.3.3.Teorias fundamentadas nos afetos	
3.5.Sínteses e pluralidades
 3.5.1.Revisões sistemáticas	
 3.5.2.Como abandonar o mundo estratificado e se inserir num universo multidimensional?	
3.6.Dissenções e conflitos	
 3.6.1.Imigrações e guerra ao terror	
 3.6.2.Bots e big data	
3.7.Conclusões sobre os estudos científicos dos estereótipos	

4. Uma nova definição
4.1. Pressupostos	
4.2. Classificação dos estudos sobre os estereótipos
4.3. As dimensões fundamentais: entitatividade e teorias implícitas	
 4.3.1.Os estereótipos e a entitatividade	
 4.3.2.Os estereótipos e as teorias implícitas	
 4.3.3.Os estereótipos entre a entitatividade e as teorias implícitas	
4.4.Cenários, entes e eventos	
 4.4.1.Entes e eventos	
 4.4.2.Cenários	
 4.4.3.Formalização do modelo	
 4.4.4.Criação computadorizada dos cenários de teste	
 4.4.5.Considerações gerais sobre o teste do modelo	
4.5.Para que modelos?	
4.6.Em direção ao modelo dos acoplamentos alternados

5. A sobrevivência dos estereótipos no século XXI
5.1.Aqui estamos
 5.1.1.Estereótipos, internet, humor e esportes
5.2. Diluir? Reduzir? Combater?
 5.2.1.Contabilidade e conversão
 5.2.2.Ídolos!
 5.2.3.Armadilhas a serem superadas
 5.2.4.Como superar as armadilhas da credulidade
 5.2.5.Oferta da informação e redução da ignorância
5.3.Modalidades de intervenção
 Agregados
   Educação antiviés
   Produtos midiáticos de entretenimento
 Categorias sociais	
   X-categorização	
   Dessensibilização e terapia	
   Valores e fortalecimento do eu
   Treinamento antiviés
 Grupos sociais	
   Contatos reais, imaginários e antecipados	
   Estratégias colaborativas	
   Resolução de conflitos	
5.4.Uma gota de otimismo em um mundo pessimista	
5.5.O futuro que nos aguarda	

Referências


Reformulação do site

Pedimos licença aos nossos leitores para modificar o conteúdo do blog. A segunda geração do site organizou-se em torno da publicação do livro eletrônico Enfrentando. Com o passar dos anos, novas leituras e novas evidências, consideramos que o conteúdo de muitos capítulos do livro eletrônico tem se mostrado desatualizado. Uma vez que estamos elaborando um novo livro sobre o assunto, tomamos a decisão de excluir o conteúdo disponível no blog. Não temos a data precisa do lançamento do novo livro, embora trabalhemos com um horizonte de publicá-lo em meados do presente ano. Desde logo, pedimos desculpas apos leitores, ao tempo em que acenamos, muito em breve, com novidades no blog.

Retornando ao blog

Após um longo tempo sem publicar qualquer post, retomamos ao nosso blog para apresentar as versões preliminares do livro eletrônico (e-bookEnfrentando preconceitos e estereótipos. Na escola, no trabalho, nas ruas e os que sobrevivem em cada um de nós.

Clique na opção Enfrentando, no menu, para ganhar acesso a cada um dos capítulos.

Resenha: Diferença e Igualdade nas Relações de Gênero – Revisitando o Debate

chamada

Luciana Alfano Moreira

   O texto Diferença e Igualdade nas Relações de Gênero: Revisitando o Debate, de autoria da Doutora em Psicologia pela USP/SP Maria de Fátima Araújo, visa debater as mudanças nas relações de gênero e a crise na masculinidade sob o impacto do feminismo, a partir de um levantamento bibliográfico utilizando diversos estudos de gênero sobre as subjetividades femininas e masculinas.
A autora inicia o artigo trazendo o conceito de gênero e a discussão do seu uso como categoria de análise, fazendo, primeiramente, a diferenciação entre o significado gramatical que serve para designar os indivíduos de sexos diferentes, relacionado à Biologia, e o seu significado cultural, relacional e situado na esfera social, baseado no uso do conceito de gênero pelas feministas. E esse caráter relacional do gênero levou a uma revisão dos estudos centrados nas mulheres, abrindo a demanda para os estudos sobre as relações de gênero, em que os homens não podem ser estudados independentemente das mulheres e vice versa. E no que tange à utilização do gênero como categoria de análise, a autora busca os estudos de Scott(1995), da brasileira Saffiotti(1997), e da historiadora francesa Louise Tilly(1994) para defender o seu uso, visto que a autora Maria de Fátima Araújo entende o gênero como uma categoria empírica, história e, portanto, analítica.
De acordo com Scott, o gênero é uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado, um elemento construtivo das relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos e, também, um modo primordial de dar significado às relações de poder. E estudar as mudanças na organização das relações sociais é estudar as mudanças nas representações de poder correspondentes. Ela busca compreender como o gênero constrói as relações sociais, como a política constrói o gênero e como o gênero constrói a política. Tilly corrobora com o pensamento de Scott e defende a necessidade de tornar o gênero uma categoria de análise, em detrimento dos métodos descritivos dos estudos sobre a história das mulheres. Já para Saffiotti, gênero (como etnia, raça e classe) são categorias de análise e operam na realidade empírica enquanto categorias históricas.
A autora também entende o gênero como sendo uma categoria política que pode ser usado para estudar a problemática da igualdade e da diferença. Historicamente, a discussão sobre as diferenças entre os sexos desenvolveu-se a partir de duas concepções: a) a essencialista: que acreditava na diferença sexual e na “essência feminina”, supõe um feminismo universal; e a b) culturalista, na qual as diferenças sexuais são resultados da socialização e da cultura. Uma terceira concepção proposta por Françoise Collin(1992) traz igualdade e diferença constituindo uma única categoria, em que há o respeito pelas diferenças, mas também a necessidade delas. Collin propôs pensar a diferença em 3 níveis: entre o sujeito-mulher e sua condição de mulher; entre as mulheres; e entre as mulheres e o mundo dos homens. Para Collin, uma mulher não é só uma mulher, ela não se reduz a sua feminilidade, é um sujeito heterogêneo.
Scott também compactua essa posição, com a afirmação de que a própria oposição binária igualdade-diferença oculta sua interdependência, já que igualdade não é a eliminação da diferença e a diferença não impede a igualdade. A enorme diversidade de identidades supera as classificações macho/fêmea, masculino/feminino, sendo tais diferenças a própria condição das identidades individuais, o verdadeiro  sentido da identidade.
O artigo de Maria de Fátima também traz um breve histórico do movimento feminista e da luta pela igualdade, logo substituída pelo debate igualdade-versus-diferença, na segunda metade da década de 70, quando se passou a falar de diferença cultural feminina, experiência feminina, e do reconhecimento da diversidade cultural de gênero. Revistas as estratégias de luta, ao final dos anos 80, as mulheres passaram a defender a igualdade não mais em nome da capacidade de se assemelharem aos homens, mas, sobretudo, por desejarem a igualdade nas diferenças.
A estratégia de luta da igualdade nas diferenças propiciou uma possível mudança nas relações de gênero, a valorização do feminino e até a libertação, por parte dos homens e das mulheres, de velhos estereótipos. Mas ao levantar a bandeira da igualdade nas diferenças, e propor tal valorização do feminino, o discurso feminista também esbarram no antigo dualismo masculino/feminino, atribuindo valores e características diferentes para cada sexo e excluindo outras possibilidades de que homens e mulheres se diferenciem dos modelos estereotipados e rígidos.
Para Maria de Fátima Araújo, as transformações propiciam que os homens se libertem do peso do machismo e que as mulheres se livrem do imperativo do feminino, adquirindo autonomia e liberdade, sem ter que seguir as características determinadas pelo gênero. Mais uma vez trazendo e consolidando a ideia do gênero como construção social; e nessa perspectiva reconstruir o feminino implica também numa reconstrução do masculino.
Na última parte de seu texto, a autora encerra de forma bastante otimista, afirmando que os homens estão tomando consciência dos conflitos impostos pelo machismo, fugindo do sexismo, e que homens e mulheres estão se distanciando dos modelos estereotipados de gênero e desenvolvendo novas formas de subjetividade. Não se pode discordar que um novo modelo de homem esteja surgindo como consequência de fatores como a independência financeira das mulheres e das políticas de proteção, além de anos e anos de luta feminista, dentre outras coisas, mas também é sabido que essas mudanças caminham a passos lentos. A posição otimista da autora não pode ser simplesmente estendida a todos os homens, nem mesmo a todas as mulheres, que também são propagadoras de pensamentos machistas, preconceituosos e estereotipados em relação a elas mesmas. Transformações como as que a autora já enxerga levam várias gerações para acontecer e dependem de vários outros motivos além dos expostos pela autora Maria de Fátima Araújo.

Referência: Araújo, M. F. Diferença e igualdade nas relações de gênero: revisitando o debate. Psicologia clínica, 2005, 17,2,41-52

Resenha: Dizer não aos estereótipos sociais – As ironias do controlo mental

Gisele D. Alberton

   O artigo inicialmente fornece uma breve introdução a respeito da influência dos estereótipos nas impressões, julgamentos, avaliações e comportamentos, destacando a importância da categorização e estereotipização ao simplificar a percepção social e facilitar o entendimento do observador sobre a realidade social. O estereótipo pode ocorrer de forma espontânea e automática. Assim a autora mostra duas visões no campo das pesquisas em relação ao controle dos estereótipos. Alguns autores defendem que o controle do pensamento estereotipado mesmo sendo difícil pode ser realizado e outros que a tentativa consciente de controlar o preconceito pode não ser conseguida com sucesso, e ainda, aumentar os pensamentos e respostas estereotipadas comparado com uma situação em que não houve tentativa de controle dos pensamentos estereotipados.
Este artigo de revisão intitulado como “Dizer <<não>> aos estereótipos sociais: As ironias do controle mental” cuja autoria é de Dora Luisa Geraldes Bernardes (2003) tem o objetivo de apresentar uma revisão teórica sobre os mecanismos de supressão dos estereótipos e das condições em que este leva ou não a consequências indesejadas. Para alcançar o objetivo citado a autora faz incursões sobre a ativação e uso dos estereótipos, os mecanismos de controle mental, as consequências da supressão dos estereótipos e as influências de moderadores para diminuir o efeito ricochete após a supressão.
Em relação à propensão para o uso de estereótipos Bernardes argumenta que o conhecimento das pessoas sobre um determinado grupo social forma o estereótipo sobre os mesmos. Essa informação é armazenada na memória e influencia a percepção e os comportamentos dos indivíduos em relação ao grupo e aos seus membros. Baseada nas ideias de Macrae (1994) a autora argumenta que os estereótipos servem para simplificar a percepção, julgamentos e ação. Este processo dá sentido ao ambiente social. Por outro lado, os estereótipos podem enviesar as percepções sociais sem que os indivíduos tenham consciência ou intenção e causar sérios danos a relações sociais. A partir de estereótipos os indivíduos podem ter a tendência a responder ao alvo estereotipado constrangendo seu comportamento e os indivíduos que são alvos podem inclinar-se a responder de modo consistente com o estereótipo (Word, Zana, & Cooper, 1974).
No que se refere aos mecanismos de controle mental a autora destaca que na tentativa de controlar as respostas, as pessoas tentam abolir os pensamentos estereotipados da consciência suprimindo-os. No entanto, essa tentativa pode fazer com este mesmo pensamento fique mais acessível. Para exemplificar sua argumentação ela busca o modelo de Wegner (1994; Wegner & Erber, 1992) explicando que é formado por dois processos cognitivos, a monitorização que busca investigar na consciência qualquer sinal do pensamento estereotipado e a reorientação da consciência que é garantir o afastamento do pensamento indesejado e focar a atenção em outro pensamento. Uma questão que a autora levanta é que enquanto o primeiro processo opera de forma automática e eficiente, o segundo requer recursos cognitivos adequados, o que não acontece de forma frequente. Outra questão é que para o indivíduo detectar o pensamento indesejado ele deve estar consciente daquilo que deseja suprimir, o que pode fazê-lo acessar muitas vezes este pensamento. O efeito irônico que a autora se refere nesse artigo é chamado de ricochete (Wegner, 1994), ou seja, a estratégia de supressão que ao mesmo tempo é uma tentativa de frear o pensamento estereotipado, também estimula o indivíduo a acessá-lo mais vezes. Por este motivo a autora questiona se é possível de fato controlar o uso dos estereótipos e erros perceptuais que estão associados aos mesmos.
Sobre as consequências da supressão dos estereótipos a autora salienta que esses pensamentos ao serem suprimidos retornam à consciência e têm impacto nas avaliações e nos comportamentos dos indivíduos em relação aos grupos. Uma segunda consequência é sobre a supressão espontânea do estereótipo. Tentativas de supressão induzidas pela situação podem aumentar a consciência das normas culturais contra a estereotipização e o preconceito através de pistas situacionais, e assim, estimular esforços espontâneos de supressão dos estereótipos. No que tange a consequências na memória, Bernardes evidencia que a supressão do pensamento estereotípico requer maior atenção, gastando uma quantidade significativa de recursos.
Nos argumentos apresentados pela autora percebe-se que a supressão pode levar a resultados indesejados como a maior acessibilidade ao pensamento que se quer suprimir. No entanto, ela nos apresenta outro grupo de autores que defendem a possibilidade de suprimir esses pensamentos sem o efeito ricochete. Ela foca em elementos que podem moderar esse efeito após a supressão dos estereótipos. Um deles é a mediação da atitude pessoal no efeito que a supressão exerce na acessibilidade ao estereótipo. Pessoas com crenças de que não aceitam estereótipos e preconceitos evitam estereotipizar os outros porque elas acreditam que os estereótipos vão contra suas crenças de justiça e igualdade. O segundo elemento são os objetivos de processamento que podem contribuir para o indivíduo não aplicá-los.
A autora aponta alguns fatores que permitem explicar porque motivo indivíduos com baixo preconceito são capazes de evitar sua ativação. Nessas pessoas há probabilidade de não chegar a ocorrer, assim o efeito ricochete será totalmente evitado. Outra possibilidade é que os estereótipos sejam brevemente ativados, e posteriormente, elas sejam eficazes em suprimi-los, não se verificando tal efeito. Outro fator seria a motivação para inibir os estereótipos. Apesar de indivíduos com baixo preconceito terem sucesso a evitar o efeito ricochete, um aspecto importante a considerar na motivação é a distinção entre interna e externa. Quando a motivação é interna para controlar o preconceito, a discrepância com as crenças pessoais leva a sentimentos de culpa e auto recriminação. Quando a motivação é externa, a discrepância leva a sentimentos de ameaça e medo. Quanto mais baixo o nível de preconceito mais forte é a motivação interna para controlar o preconceito. As normas sociais salientes também podem servir como uma fonte reguladora de motivação externa para diminuir os estereótipos após o período de supressão.
Além destes fatores citados anteriormente a autora apresenta estratégias alternativas à supressão do estereótipo. Ela argumenta que indivíduos com baixo nível de preconceito podem recorrer a outras estratégias de controle dos pensamentos para evitar o efeito ricochete, as quais seriam:
a) a substituição do pensamento estereotipado: mais do que suprimir os pensamentos indesejados esses pensamentos podem ser substituídos por crenças igualitárias. A disponibilidade de pensamentos substitutos previne a ocorrência do efeito ricochete. No caso das pessoas com alto preconceito suas crenças pessoais são fortemente estereotípicas ficam sem pensamentos disponíveis que possam substituir os pensamentos intrusivos.
b) a individuação do alvo: pessoas com baixo preconceito podem procurar informações individuais sobre o alvo e formar impressões com base nessas informações.
Em relação ao segundo elemento citado anteriormente (os objetivos de processamento do indivíduo) indivíduos que têm como objetivo consciente não estereotipizar podem tentar criar outro estado mental e não suprimir o existente. Por exemplo, ao invés de tentar suprimir os estereótipos, eles poderiam adotar pensamentos mais justos com relações igualitárias. Esta estratégia leva o estado de monitorização a procurar pensamentos que não são consistentes com o estado mental reduzindo o efeito irônico.
Através das reflexões de Bernardes há possibilidade de pensar que as pessoas têm determinados conhecimentos sobre os grupos sociais que são considerados ao percebê-los. O problema é que essa informação estereotipa pode enviesar as percepções sociais e causar sérios danos às relações sociais. Desse modo a importância de fazer o controle das respostas estereotipadas reside no fato de que as injustiças sociais que resultam da ativação e uso desses estereótipos podem ser evitadas. Embora a autora afirme através de sua revisão que a supressão poder ser uma estratégia pouco eficaz de autorregulação devido aos seus efeitos irônicos, ainda sim é necessário uma quantidade maior de estudos sobre a mesma já que é um fenômeno complexo que pode ser influenciado por vários fatores como os motivacionais.
A forma de fazer este controle é importante para que seus efeitos a curto e longo prazo possam ser positivos nos contextos sociais. Uma alternativa que a autora traz em suas reflexões é dizer “não” ao estereótipo substituindo os pensamentos estereotipados ou criando outros estados mentais para transformar a informação existente em algo que não prejudique os grupos e seus membros e assim promover relações mais igualitárias. Mas, independente das estratégias o ação de controlar estereótipos e preconceito é um processo necessário, árduo que requer motivação, consciência e recursos cognitivos.
Referência: Bernardes, D. L. G. (2003). Dizer <<não>> aos estereótipos sociais: As ironias do controlo mental. Análise Psicológica, 3, 307-321.

Resenha: Aparência física e amizade íntima na adolescência – Estudo num contexto pré-universitário

Luciana Alfano Moreira

   O artigo de Raul Cordeiro sobre a amizade íntima na adolescência começa com uma reflexão acerca da importância do desenvolvimento de relações de intimidade nessa fase da vida do indivíduo, e a percepção sobre o auto-conceito. Para tanto, conceitua a intimidade como uma relação emocional caracterizada pela concessão mútua de bem estar, pelo consentimento explicito para revelação dos assuntos privados, podendo envolver a esfera dos sentidos e pela partilha de interesses e atividades em comum. Cordeiro também afirma que o conceito de intimidade pode ser estruturado em oito dimensões: sinceridade e espontaneidade; sensibilidade e conhecimento; vinculação; exclusividade; dádiva e partilha; imposição; atividades comuns; confiança e lealdade.
Na esfera individual, a intimidade é mais facilmente expressa e desenvolvida, quando se tem a experiência do autoconhecimento e se tem conhecimento dos objetivos do indivíduo para a sua vivência social. Segundo o autor, esse exercício possibilita que o autoconhecimento ocorra simultaneamente ao conhecimento do outro. Dessa forma, cordeiro também aborda o conceito de intimidade corporal, essencialmente estruturada pela percepção que o sujeito tem de si e do próprio corpo, o auto-conceito. O autoconceito é importante na satisfação global, sendo importante também para a satisfação relacional.
Na adolescência se desenvolvem as verdadeiras amizades íntimas porque a necessidade de intimidade aumenta, porque o adolescente está mais apto a viver essas relações, e porque há uma mudança no modo como ele expressa sua individualidade e intimidade perante os outros. Nessa fase também, os adolescentes se sentem mais a vontade com seus pares do que com os adultos. Cordeiro também afirma que as mudanças decorrentes da puberdade e dos impulsos sexuais devem ser consideradas, as quais, evidentemente, ocorrem de forma diferente entre rapazes e moças, e só vai se equilibrar perto da fase adulta.
O autor salienta que a importância das relações de amizade íntima na adolescência também está na possibilidade que o jovem tem de se expressar, sem temer ser ridicularizado ou criticado. É determinante, segundo Cordeiro, na construção da identidade, dos valores, objetivos e sentimentos de pertença e autoestima. Talvez caiba acrescentar nesse tópico do autor que a identificação com os pares é sim, fundamental. Estar entre iguais e o conforto do sentimento de pertença são importantes nessa fase da vida.
Mas também se deve considerar que é na adolescência que ocorrem, cada vez com mais frequência, os casos de bullying. Adolescentes são ridicularizados por adolescentes por causa de características físicas consideradas fora do padrão, como excesso de peso ou baixa estatura, por comportamentos considerados afeminados por parte dos meninos, ou masculinizados por parte das meninas, pelo modo de se vestir ou de acordo com a “tribo” a qual o adolescente pertence. E, acrescendo ao que foi exposto pelo autor, a existência dessas “tribos”, muitas vezes estereotipadas e que rivalizam com outras tribos, serve para que um jovem tenha abertura da sua individualidade com outros, os adolescentes encontram experiências de vidas, gostos e afinidades semelhantes para relatar e compartilhar. Assim, os adolescentes se sentem seguros, protegidos em suas relações.
O estudo de Raul Cordeiro teve como objetivo geral analisar as relações entre a percepção sobre a aparência física e as relações de amizade íntima na adolescência, e como o próprio autor relata, esse objetivo é subdividido nos seguintes: a) avaliar a percepção sobre a aparência física em adolescentes de ambos os sexos; b) avaliar o nível de desenvolvimento de relações de amizade íntima, no mesmo grupo de adolescentes de ambos os sexos; e c) identificar diferenças entre sexos em relação à percepção sobre a aparência física e ao nível de desenvolvimento de relações de amizade íntima. A principal hipótese formulada é a de que a percepção que os adolescentes tem da sua aparência física influencia a forma como estabelecem relações de amizade íntima.
O estudo foi feito com 309 alunos distribuídos em duas escolas pré-universitárias, com idade média de 18 anos. A Intimate Friendship Scale foi utilizada com o objetivo de avaliar a amizade íntima, a The self-perception profile for college students (sete escalas das 13 originais), e a Notação Social da Família – Graffar adaptado. Além disso, outras variáveis como escola, sexo, idade, dentre outras, foram avaliadas.
Dentre os resultados observados, vale observar que a Escala de Amizade Íntima aponta que há um grau mais elevado de maturidade no sexo feminino, e que são também entre as mulheres que os resultados de amizade íntima são mais elevados, como já visto em estudos anteriores. O autor afirma que esse resultado se deve provavelmente à definição mais precoce da identidade no sexo feminino e, consequentemente, das uma definição mais clara do seu papel nas relações com os outros. Ainda na escala de Amizade Íntima as dimensões Confiança e Lealdade obtiveram maior valor médio, o que para o autor, indica que os jovens primam por amizades que possam partilhar segredos e que não haja traição da revelação.
Outro dado interessante é que a percepção de autoconceito foi elevada no geral, sendo que os valores femininos foram menores que os masculinos, assim como na dimensão percepção sobre aparência física. No item amizade íntima com o melhor amigo a dimensão atividades em comum teve pouca diferença entre os sexos. O grupo estudado realça a importância das atividades em comum, como no lazer, no desempenho das tarefas ou da ocupação do tempo livre. Entretanto, o autor acredita que o resultado que não difere entre rapazes e moças se dá porque eles tem as atividades em comum como uma das expressões mais importantes da amizade.
Em amizade íntima com a melhor amiga houve maior consenso entre ambos os sexos nas dimensões amizade íntima, vinculação, confiança e lealdade. Já nas dimensões sinceridade e espontaneidade, sensibilidade e conhecimento mútuo, exclusividade relacional, dádiva e partilhas e atividades comuns, foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os sexos.
Na discussão, o autor conclui que a vivência das relações de amizade íntima na adolescência é fortemente influenciada pelo sexo. Nas mulheres, o fenômeno de identificação inter-pares, e para os rapazes, a necessidade de afirmação perante o sexo oposto. O estudo ignora adolescentes de orientação homossexual, e não considera essa variável. Além disso, Cordeiro observou que os valores de percepção sobre a aparência física se revelam mais influentes num baixo autoconceito feminino, provavelmente porque as cobranças quanto a aparência física feminina seja muito mais forte do que em relação aos homens. Mulheres são preparadas para serem bonitas e atraírem o sexo oposto desde muito novas, e quem não se encaixa no padrão de beleza exigido acaba sofrendo mais, chegando a ter problemas de autoestima.

Referência: Cordeiro, Raul A. Aparência física e amizade intima na adolescência: Estudo num contexto pré-universitário. Análise Psicológica, 24, 3, 509-517, 2006.

Resenha: Cognição, categorização, estereótipos e vida urbana

Gisele D. Alberton

No resumo introdutório o autor discute a função de perceber e categorizar como processos fundamentais da vida social. O processo de categorização auxilia os indivíduos na organização da realidade social, no entanto este processo também influencia o julgamento dos grupos ou seus membros.
O ensaio intitulado como “Cognição, categorização, estereótipos e vida urbana” com autoria de Marcos Emanoel Pereira tem objetivo de avaliar e esclarecer alguns mecanismos psicológicos envolvidos na manifestação do julgamento estereotipado pelos habitantes dos centros urbanos, enfatizando o papel exercido pela confirmação e desconfirmação das crenças.
Inicialmente o autor destaca a complexidade da vida urbana e argumenta que a sobrevivência humana nos centros urbanos é possível porque o ser humano tem dois sistemas de aprendizagem, um que permite lidar com as rotinas diárias e outro que o ajuda a lidar com as situações inesperadas. Esses sistemas são complementares.
As informações que são adquiridas no cotidiano através da capacidade de percepção dos indivíduos são organizadas e armazenadas na memória em termos de crenças. Isso é possível devido à categorização. O autor explica que os estudos atuais apontam que uma parte do pensamento é regida por dispositivos mentais que permite pensar os indivíduos com quem se interage em termos de categorias mais amplas e não a partir das particularidades de cada pessoa encontrada no mundo. Assim, esta modalidade também permite que rótulos verbais sejam aplicados a objetos presentes nos domínios: físico, mental e social da vida.
Esse repertório de conhecimentos adquiridos ao longo da vida geram expectativas e são utilizados como base para guiar os comportamentos no mundo social. Baseado nesse conjunto de argumentações o autor destaca a influência que a categorização exerce sobre a percepção social. A partir da ativação dessas estruturas é possível realizar julgamentos sobre os membros da categoria ativada. O autor ainda apresenta exemplos durante suas reflexões (e.g., faxineira no prédio – que vive na periferia ou que vive num bairro próximo) em que é possível visualizar como os estereótipos podem atuar no cotidiano dos indivíduos. Também mostra evidências na literatura que as ideias estereotipadas poderiam ser mais frequentes em centros urbanos porque as pessoas se deparam com uma variabilidade maior de grupos sociais. No entanto, outros autores citados neste ensaio defendem que o pensamento estereotipado se manifesta menos em pessoas que vivem em centros urbanos porque a literatura aponta que a vida nesses locais possibilita maior acesso a informações, o que vai contra as concepções estereotipadas, e também, proporciona maior vivência entre pessoas diferentes. O autor coloca que o fato de as pessoas terem maior acesso à informação não há indício de que elas irão rejeitar ou inibir a expressão das crenças estereotipadas. Em algumas circunstâncias as categorias podem ser ativadas de forma incondicional enquanto outras serão ativadas de forma condicional.
O autor apresenta evidências na literatura sobre a ativação incondicional dos estereótipos que são derivados do trabalho de Gordon Allport sobre a natureza dos preconceitos. Nesta linha a ativação da categoria é um processo inevitável. Em contraposição a esta ideia, o autor relaciona estudos que se posicionem sobre a ativação dessas categorias de forma condicional e que dependem de disparadores adequados. A aplicação do raciocínio categórico torna-se mais comum quando falta ao percebedor motivação, tempo ou capacidade cognitiva para lidar com as demandas sociais.
Assim, não é necessariamente a maior quantidade de informações a que se encontra exposto nos ambientes urbanos que acarretará em um menor grau de estereotipização. O que vai fazer a diferença nas interações sociais é a qualidade dos contatos onde indivíduos podem obter as informações necessárias para fazer julgamentos sociais adequados, o que não é privilégio dos grandes centros urbanos.
Este artigo demonstra que a questão crucial é evitar o predomínio dos estereótipos, pois eles influenciam a percepção, e consequentemente, os pensamentos e comportamentos prejudicando as relações sociais. O mais importante é estar atento ao contexto em que se vive e adotar práticas de reflexão das próprias ações.
Referência: Pereira, M. E. (2008). Cognição, categorização, estereótipos e vida urbana. Ciências & Cognição, 13(3), 280-287.