Artigo publicado: Minority Essentialism in Response to Majority Treatment

Título: When Differences Become Essential: Minority Essentialism in Response to Majority Treatment

Autores: Laurenz L. Meier, Norbert K. Semmer, and Jörg Hupfeld

Periódico: Personality and Social Psychology Bulletin 2009;35 643-655

Resumo: clique aqui para obter

Notícia do dia: Sérvios reclamam contra o uso de estereótipos na televisão belga

Os sérvios não gostaram nem um pouco da maneira pela qual duas personagens, Milena e Marjana, pretensamente sérvias, foram apresentadas numa das etapas eliminatórias do Eurovision Song Contest. De acordo com o embaixador sérvio na Bélgica, onde a etapa do concurso foi realizada, a forma pela qual as garotas sérvias foram representadas, chegadas a uma vodka e ao roubo de celulares, reflete estereótipos que em nada favorecem o desenvolvimento de laços positivos entre os países. Clique aqui para ler a matéria publicada no Balkan Travellers.

Balkan Travellers

Atualizado para a aula do dia 30/04/2009 (FCH391)

Resenha: You are what you listen To: Young People’s Stereotypes about Music Fans

Marcus Vinicius C. Alves

A música é um dos meios de expressão mais utilizados por pessoas em qualquer lugar do mundo. O presente artigo sugere ainda que para os jovens, essa intensidade é ainda mais visível, a música – ou o estilo musical – serviria como uma insígnia que a priori revelaria para outrem em qual grupo social este jovem estaria incluso e qual o estilo de vida que ele possui. As palavras cantadas displicentemente no meio da rua, a camiseta preta de sua banda favorita ou mesmo o adesivo do Camaleão colado no carro seriam instrumentos cruciais para a identificação grupal. Os autores lembram que nos últimos anos houve uma proliferação de recursos virtuais – blogs, fóruns e comunidades virtuais – onde demonstrar seu estilo musical era peça-chave para ser bem ou mal visto por outros, o que você ouve teria se transformado ainda mais em um estandarte do que você é. Os jovens teriam se apegado aos clãs de identidade musical parecida, expondo quem são, quem querem ser e como querem ser percebidos. É compreensível então o argumento científico de que para adolescentes a música seria um cartaz melhor do que a pessoa é do que as roupas que ela veste, os filmes que vê ou os hobbies que possui. Tendo então a compreensão de que revelar o estilo musical encaixa o indivíduo em um grupo, o artigo propõe o estudo sobre como tais pessoas e seus grupos são percebidos. Qual informação é comunicada pela preferência musical.

Pessoas preferem estilos musicais que reforcem e reflitam aspectos da sua identidade e personalidade (e.g. indivíduos procurando sensações intensas ouviriam punk, enquanto que rebeldes ouviriam rock ou rap, e indivíduos que se percebem como criativos ouviriam músicas sofisticadas como jazz ou clássica), então, somando ao grupo em que a pessoa é encaixada, o gosto musical também revelaria seus valores e personalidade. Os autores argumentam que estudos revelaram que, primeiramente, todos teriam crenças sobre os estilos musicais e as pessoas que os ouvem, além disso, ouvintes de certos gêneros musicais já teriam em si estereótipos de conduta e personalidade definidos. Ademais, o artigo sugere que os estereótipos encontrados para cada gênero musical tenham um núcleo de realidade quando relacionados com os ouvintes destes gêneros, ou seja, os estereótipos formados não estariam de todo errados (Seriam os baianos percebidos como um povo alegre por causa do axé? Ou o axé percebido como um estilo alegre por causa dos baianos?).

Apesar dos estudos revelarem que as pessoas possuem de algum modo uma visão sortida de características psicológicas dos integrantes de certos gêneros musicais, os autores argumentam que ao serem relacionados os resultados dos estudos realizados por cientistas anteriores são encontradas certas limitações. Primeiramente, os estudos só observaram os fatores psicológicos, esquecendo os culturais e sociais. Por pesquisas, já é sabido que o estilo musical que se adere também está relacionado à classe social em que se encontra (e.g. fãs de jazz e música clássica comumente estão relacionados com a classe alta e com maior grau de instrução, enquanto que a classe trabalhadora ou menos instruída costuma ouvir músicas como gospel, rap e, no Brasil, poderíamos citar o pagode). Há ainda pesquisas que revelaram que a etnia também está diretamente ligada ao que se ouve, nos EUA, negros tendem a ouvir jazz e rap, enquanto que brancos ouviriam mais o rock, a música clássica e o country. Logo, os estereótipos musicais poderiam estar diretamente relacionados aos étnicos. Outro limite é o desconhecimento sobre como os estereótipos funcionariam em diferentes estados ou países, pois cada estudo tem sido realizado em locais geográficos pontuais. Sem dúvidas, este fator não pode ser negligenciado, pois pessoas em diferentes países são expostos a diferentes estilos musicais e são estimulados positiva ou negativamente de formas também diferentes ao entrarem em contato com esses estilos (e.g. no Pará o estilo “arrocha” foi menos ouvido do que na Bahia e assim é menos valorizado que o “tecnobrega”, equanto que na Bahia o superpopular não fez sucesso algum. Assim temos dois estilos parecidos qualitativamente, mas que possuem valores diferentes para cada estado.)

A pesquisa realizada se ateve a gêneros musicais, pois em um teste foi revelado que os diferentes subgêneros musicais são pouco conhecidos, o que dificultaria consideravelmente a obtenção de resultados verossímeis devido a pouca familiaridade do grupo experimental com as vertentes de cada gênero. A pesquisa foi realizada na Inglaterra e propôs comparar os dados com estudos semelhantes nos Estados Unidos visando fazer com que os dados fossem passíveis de generalização. Os autores afirmam que o estudo teve como perguntas principais (1) O quanto as pessoas concordam sobre aspectos psicológicos e sociais ligados a estereótipos de estilos musicais; (2) seriam os estereótipos entre os gêneros distintos?; E (3) o quanto há de generalização nos estereótipos? Utilizando de pesquisas anteriores, os autores tiveram como hipótese a concordância entre os indivíduos com a existência de estereótipos únicos por gêneros, especialmente no rap, rock e clássicos, e que o conteúdo dos estereótipos seria similar tanto nos Estados Unidos, quanto na Inglaterra.

O grupo experimental da pesquisa foi formado em grande parte por Brancos (87,5%) e pertencentes à classe média (61,3%), os autores não citam, mas tais fatores podem ter influenciado os resultados, pois homogeneízam a amostra, podendo revelar a percepção e os estereótipos contidos em um pequeno grupo e não em nível global. Esse grupo experimental ainda limita a generalização desse estudo para o Brasil, sendo esses dados exageradamente divergentes à população nacional. O estudo fez com que o grupo experimental julgasse protótipos de fãs dos gêneros musicais específicos e associasse a esses estereótipos certas características em uma escala tipo Lickert. A pesquisa avaliou a percepção das características psicológicas, sociais, de religiosidade, de personalidade, sociais e étnicos.

Os resultados da pesquisa foram condizentes com as expectativas dos autores, somado a isso, tem-se que os jovens têm os padrões dos estereótipos dos fãs de certos grupos musicais altamente estruturados cognitivamente. Os resultados revelaram que alguns estereótipos foram similares em certos construtos (e.g. a personalidade dos fãs de rock e música eletrônica), todavia as particularidades dos estereótipos foram diferenciadas em um nível macro de entendimento. Houve ainda a confirmação do potencial de categorização social acima da psicológica, pois os resultados acerca da classe e da etnia de cada gênero foram mais consistentes que os de personalidade. O grupo experimental americano e o inglês obtiveram resultados semelhantes, entretanto, os países são também semelhantes em diversas características, tais resultados poderiam ser diferentes em um país em desenvolvimento, tendo como idioma o português e a maioria da sua população pouco alfabetizada.

Entretanto, a pouca adaptabilidade do estudo para âmbitos nacionais não desmerece a sua compreensão de que os resultados de fato demonstraram a importância dos estilos musicais nas relações intergrupais, propondo para outros cientistas, a reflexão e experimentação posterior na área.

Referência: Rentfrow, P. J., McDonald, J. A., Oldmeadow J. A. (2009). You are what you listen To: Young People’s Stereotypes about Music Fans. Group Processes & Intergroup Relations, 12, 329-344.

Características fundamentais dos estereótipos: a homogeneidade

Qualquer grupo social impõe uma série de pressões normativas em relação aos seus membros. O efeito mais evidente deste conjunto de pressões é a adoção, por parte dos membros do grupo, de um padrão relativamente homogêneo de conduta. Esta homogeneidade se manifesta em domínios tão diversificados quanto tanto as crenças, os valores e as atitudes, mas mostra-se em plena luz no domínio das aparências físicas.

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Terça-feira, 04 de dezembro de 2007, 16:14

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Atualizado para a aula do dia 23/04/2009 (FCH391)

Características fundamentais dos estereótipos: a saliência

Uma vez que os estereótipos podem ser caracterizados como crenças socialmente compartilhadas a respeito dos membros de uma categoria social, os referentes devem ser facilmente identificados e diferenciados dos membros das outras categorias. Assim, uma das características fundamentais dos estereótipos é a saliência. Nas imagens apresentadas abaixo, as baianas são facilmente diferenciadas das pessoas que não o são. Apenas nas circunstâncias em que os membros de uma categoria social podem ser diferenciados, os estereótipos podem ser aplicados e ativados.

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Terça-feira, 04 de dezembro de 2007, 15:24

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Terça-feira, 04 de dezembro de 2007, 15:18

Atualizado para a aula do dia 23/04/2009 (FCH391)

Características fundamentais dos estereótipos: o consenso

Em que pese algumas divergências, uma representação estereotipada deve ser consensual. Ainda que nos pormenores seja possível garimpar aqui e ali pequenas diferenças, o cerne da representação permanece , no entanto, inabalável. Baianos e visitantes não encontram qualquer dificuldades em identificar a categoria social das senhoras apresentadas na foto abaixo. Os trajes, os gestos, assim como as expressões faciais, permitem identificá-las facilmente. E, claro, em torno da categoria das baianas, assim como de qualquer grupo social, gravita um conjunto de crenças socialmente compartilhadas, os estereótipos.

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Atualizado para a aula do dia 23/04/2009 (FCH391)

Estereótipos e categorias sociais: mamãe é down

Contribuição: Luzia Mascarenhas

Matéria publicada no website Saci apresenta uma reportagem sobre um casal, onde o homem tem uma deficiência mental leve e a mulher tem síndrome de down. Tal reportagem retoma um assunto muitas vezes polémico acerca da capacidade de mulheres com síndrome de down poderem exercer o papel de mãe. A sociedade muitas vezes trata estas mulheres como totalmente incapazes, o que não corresponde a realidade. Muitos preconceitos ainda permeiam esta questão, as mulheres com deficiência muitas vezes são desacreditadas a levarem suas vidas como as demais, como se não tivessem o direito de se desenvolverem nos mais diversos âmbitos e contextos. Clique aqui para ler matéria.

No attitude?

A Cambridge Strawberry Fair é um evento secular. Atrai visitantes de toda a Inglaterra, o que não chega a agradar a todos os habitantes desta aprazível e tranqüila cidade universitária inglesa. Os moradores avisam, no entanto, que há uma Strawberry diurna, para as crianças e as famílias, e uma festa noturna para drunkers e junkies. O que talvez explique o cartaz abaixo, encontrada em um dos acessos ao Midsummer Commons, o local onde a feira é realizada. Os organizadores solicitam aos participantes algumas coisas bastante razoáveis. Copos e garrafas de vidro podem quebras e causar ferimentos até certo ponto graves. Drogas, nudismo, agressões, racismo e homofobia constituem atos ilegais e as autoridades devem se esmerar para que as leis sejam respeitadas. Agora, não ter atitudes? O que isto pode significar?

Cambridge, UK

Atualizado para a aula do dia 02/04/2009 (FCH391)

Primeiro de abril: sobre o mentir e o mentiroso

Quem ainda não se obrigou a perpetrar algumas mentiras, quando a situação assim o exigia ? E nessas circunstâncias, você se torna um mentiroso ? Provavelmente não, pois se todos cometem umas mentirinhas de quando em vez, ninguém se transforma em um mentiroso empedernido pelo simples fato de mentir.
Podemos afirmar que, com raríssimas exceções, todos mentem. Isto ocorre porque muitas circunstâncias da nossa vida cotidiana impõem que contemos algumas mentiras, sob pena de criar zonas de atrito perfeitamente dispensáveis na nossa vida social. Muitas mentiras encontram-se associadas ao domínio da polidez. Circunstâncias bastante comuns impõem a adoção de pequenas aleivosias, que tornam as rudezas do dia a dia menos ásperas. Uma tia que se apresenta toda satisfeita com a sua (horrenda) roupa nova, o jantar gelado servido na casa da sogra que você afirma estar numa temperatura absolutamente maravilhosa, a cerveja quente na casa do amigo que você afirma estar estupidamente gelada, o videotape das viagens de férias dos parentes que você confirma estar ansioso para assistir ou mesmo a insistência para que uma visita inconveniente permaneça um pouco mais quando se está morrendo de sono, todas essas situações costumeiramente levam à emissão de algumas mentiras nas quais a cortesia, a polidez e a civilidade parecem justificar o deslize moral.
Em outras circunstâncias as pessoas mentem por motivos sentimentais. Pais que evitam que os filhos tomem conhecimento de determinadas situações, filhos que desejam poupar os pais de dissabores previsíveis, esposos, noivos ou namorados que afirmam ou deixam de afirma certas coisas para o parceiro ou mesmo amigos que inibem a expressão de determinados comentários que poderiam magoar ao outro são situações que envolvem mentiras que se justificam por razões sentimentais.
Afora estes dois fatores, muitas mentiras socialmente justificáveis são expressas por pressões profissionais. Uma secretaria que é obrigada a afirmar que o chefe se encontra ausente, o médico e a enfermeira que se obrigam a contar mentiras por razões humanitárias e com o objetivo de trazer um pouco mais de conforto ao paciente, o político por pressões partidárias ou eleitorais ou o professor por razões pedagógicas – e às vezes não tão pedagógicas assim – , todas essas situações profissionais comportam com uma certa freqüência a possibilidade da emissão de algumas pequenas mentiras.
Ora, na medida em que assumimos que a mentira encontra-se sempre presente na vida social, temos que sustentar a hipótese de que somos relativamente hábeis na arte de detectá-las. Verdade ? As coisas não parecem ser tão simples assim. Em primeiro lugar, resultados empíricos sugerem que os humanos detectam a acurácia de um interlocutor em uma proporção um pouco acima do que seria esperado por acaso. E mesmo assim, a detecção da mentira oscila entre 35 a 40%, enquanto a da verdade entre 70 e 80%, sendo estes últimos valores apenas aparentemente altos, pois de modo geral os percebedores geralmente afirmam que o interlocutor está falando a verdade, o que justifica esses resultados tão disparatados.
Esses resultados pobres na identificação da acurácia não impedem as pessoas de acreditarem que são capazes de identificar a mentira. Isto é perfeitamente explicável, desde que admitamos que dispomos de uma série de indicadores que nos permitem determinar se alguém está mentindo. Alguns desses indicadores envolvem componentes gestuais, tais como a postura, o olhar, os gestos com as mãos e com o corpo; outros indicadores incluem elementos não-verbais da fala, tais como pausas, gagueira e hesitações; e, por fim, dispomos de indicadores verbais, tais como a extensão da fala, a coerência do argumento e a inclusão de informações irrelevantes.
Com um número tão grande de indicadores seria perfeitamente plausível supor que as mentiras poderiam ser facilmente detectáveis, o que, como assinalamos anteriormente, não é verdade. O que dificulta, então, a identificação da mentira ? Um primeiro aspecto que podemos considerar relaciona-se com os nossos limites cognitivos. Considerando a nossa avareza cognitiva, dificilmente conseguiríamos prestar a atenção, ao mesmo tempo, nos diversos indicadores que listamos anteriormente. A nossa capacidade de processar informações possui um limite e tal limite impede que detectemos todos os elementos gestuais, não-verbais e verbais que poderiam identificar a mentira. Ainda que tivéssemos uma capacidade ilimitada de processar todas as informações, o sucesso na identificação da mentira não teria muitas chances de sucesso, se considerarmos a tendência que temos em representar e confiar mais nas informações genéricas, uma vez que muitas vezes a mentira se encontra nos detalhes. Um outro aspecto que nos impede de identificar com mais precisão a mentira possui um caráter motivacional. Muitas vezes é preferível que não saibamos a verdade, o que pode gerar um fator de distorção que impede uma percepção acurada do que está acontecendo. Enfim, um outro fator que dificulta a identificação da mentira vincula-se diretamente com o que Gilbert denominou teoria espinoziana das crenças. Nesse caso, o argumento central é o de que tendemos inicialmente a acreditar em tudo o que nos dizem e que apenas ao final, após uma análise apropriada das implicações de todos os argumentos apresentados pelo nosso interlocutor, temos a possibilidade, quando o temos, de refutar aquilo que nos foi dito e inicialmente acreditamos.
Ainda assim, poderíamos supor que alguns atributos do percebedor possam contribuir na identificação da mentira. Um elemento bastante considerado pelo senso comum é o grau de intimidade entre que conta e quem ouve a mentira. A idéiam básica, nesse caso, é a de que se o grau de intimidade entre os dois for alto, o percebedor tenderá a identificar mais facilmente a mentira. A justificativa para tal encontra-se no entendimento de que o maior grau de conhecimento e proximidade forneceria ao percebedor um repertório de rotinas capaz de servir como parâmetro para julgar as ações do outro, o que sem dúvida facilitaria a identificação das situações em que o interlocutor estiver mentindo. Ao contrário dessa suposição, evidências empíricas parecem apontar para uma direção oposta, encaminhando-se no sentido de sugerir que a intimidade dificulta a identificação da mentira. Tais argumentos estão assentados em duas idéias básicas: a primeira delas, sustenta que o conhecimento e a familiaridade impõem uma percepção marcantemente enviesada do interlocutor, levando o percebedor a confiar muito mais no conhecimento prévio disponível sobre o seu interlocutor, o que poderia levar a uma interpretação distorcida das evidências presentes na situação; a segunda suposição envolve o problema do grau de confiança entre o percebedor e aquele que mente, sugerindo que quanto maior for o grau de confiança do percebedor no interlocutor , algo inerente à condição de intimidade, maior será a tendência a desconsiderar os indicadores de mentira.
E se o percebedor suspeitar que o seu interlocutor estiver mentindo, especialmente se ele for uma pessoa profissionalmente treinada na arte de identificar a mentira ? Estudos empíricos indicam que a suspeita pouco acrescenta no grau de acurácia da identificação da mentira, especialmente porque não é incomum que uma pessoa injustamente acusada de estar mentindo passe a apresentar padrões de comportamento bastante semelhante àquelas que estão mentindo. E o mais importante, o treino também parece contribuir muito pouco, a se considerar dados obtidos na literatura que sugerem que profissionais habilitados para lidar com situações que envolvem mentira, tais como procuradores, juízes, inspetores alfandegários ou policiais, não mostram uma performance acima da média de uma pessoa sem qualquer treina especial para a identificação da mentira. A única categoria profissional que obteve resultados acima da média foi a dos agentes secretos e, mesmo nesse caso, apenas quando avaliavam se uma única pessoa submetida a interrogatório estava mentindo naquela circunstância particular, sem que pudessem obter um resultado semelhante quando tinham que avaliar se várias pessoas estavam mentindo ou não.
Afora essas características do percebedor, podemos apontar alguns elementos característicos daquele que mente e que tem sido objeto de interesse dos estudos psicossociais sobre a mentira. Uma questão importante diz respeito à faixa etária de quem mente. Quem mente mais, adultos ou crianças ? As pessoas crêem que os adultos mentem mais, não só pela natureza mais complexa das situações em que estão envolvidos, como também porque dispõem de esquemas cognitivos mais sofisticados que os tornam mais habilitados a desenvolverem argumentos ficcionais plausíveis. Não que a criança seja vista como imune a mentiras. Apenas as mentiras infantis são vistas como qualitativamente diferentes daquelas contadas pelos adultos, sendo interpretadas prioritariamente como fantasias inocentes – ou não tão inocentes assim – construídas pela mente infantil.
Uma outra questão importante é a do gênero: quem mente mais, o homem ou a mulher ? Os indicadores que dispomos parecem indicar que não são encontradas diferenças significativas a respeito da quantidade de mentiras contadas por homens e mulheres. De uma forma compatível com o que seria previsto pela teoria da identidade social, temos evidências que os homens crêem – ou afirmam crer – que as mulheres mentem mais, enquanto as mulheres sustentam que os homens mentem mais.
Afora esta questão do gênero e da faixa etária, as pessoas não indicam uma diferença significativa na quantidade de mentiras contadas por aqueles a quem conhecem quando comparados com pessoas desconhecidas. Ainda assim, temos indicadores que elas tendem, nesse caso, a suspeitar mais das pessoas conhecidas que das pessoas desconhecidas.
Existiria, então, alguma forma de reduzir a incerteza numa situação em que suspeitamos que alguém está mentindo ? Algumas estratégias podem ajudar, embora nenhuma delas ofereça qualquer garantia de total acurácia. Uma delas é um tipo de estratégia que pode ser definida de interativa. Nesse caso, o percebedor acerca-se daquele a quem ele suspeita, conduzindo uma série de indagações, tentando identificar possíveis contradições na argumentação apresentada pelo suspeito. Essa estratégia é certamente invasiva e as conseqüências podem não ser exatamente as mais agradáveis para o percebedor.
Afora desta modalidade, dispomos de estratégias não-interativas, uma ativa e uma outra passiva. No caso da estratégia ativa o percebedor indaga a várias outras pessoas que conhecem o suspeito, investigando assuntos não diretamente relacionados com o assunto da mentira e com base nessas respostas procura inferir se essas pessoas a quem ele indagou sugerem que o suspeito costuma mentir. Este tipo de estratégia também pode ser considerada invasiva, com o agravante de expor de forma bastante ostensiva a pessoa que está conduzindo a investigação.
A estratégia passiva consiste em observar o suspeito interagir com outras pessoas e com base nas pistas e indícios que ele oferecer inferir em que medida ela pode estar mentindo e quais são os principais que permitem inferir quando e em que circunstâncias ele costuma mentir.
O que podemos concluir, então, sobre a mentira e o mentir ? Em primeiro lugar, não temos nenhuma razão fundamentada que nos permita suspeitar que uma pessoa que está mentindo se comporte de forma muito diferente daquela que está falando a verdade. Certamente esta afirmação deve ser cuidadosamente considerada, pois contar uma mentira exige uma maior ativação cognitiva, um maior desgaste emocional e um auto-monitoramento mais intenso, o que poderia diminuir as instâncias de controle consciente, permitindo o afloramento de muitos indicadores que acirrariam a suspeita sobre aquele que mente.
Uma segunda conclusão é que geralmente procuramos identificar quem está mentindo a partir da utilização de pistas inadequadas. Realizar inferências sobre se alguém está mentindo com base na análise da consistência lógica do suspeito poderia ser uma boa alternativa se as pessoas costumeiramente desenvolvessem de forma lógica os argumentos que sustentam, o que não parecer ser o caso a se considerar as inumeráveis heurísticas ou atalhos mentais utilizados cotidianamente. Um outro elemento que dificulta a identificação da mentira relaciona-se com o uso freqüente de pistas baseadas na categoria social a qual o suspeito pertence, o que favorece ao uso de estereótipos, julgando ao suspeito pela vinculação da categoria a qual ele pertence e não pelos seus atributos e qualidades individuais.
Uma terceira conclusão relaciona com a dificuldade em se obter feedbacks nas situações em que a mentira está presente. Raramente alguém nos indica se descobrimos a verdade ou não do que ele ou ela falou e esta falta de treino certamente intensifica a incerteza sobre se de fato detectamos se alguém falou ou não a verdade.

Crenças e estereótipos

Os estereótipos sociais são crenças. Uma crença pode ser concebida como uma atitude de adesão a uma proposição, que se exprime sob a forma de um enunciado cuja verdade nem sempre é possível demonstrar. Desta forma, dois domínios fundamentais devem estar presentes para a constituição de uma crença, a dimensão do conhecimento, relativa aos referentes da proposição ou ao conteúdo dos enunciados e, por outro lado, um sentimento pessoal e subjetivo de asserção ou aceitação daquilo que é visto como verdadeiro ou justificado. Assim, uma crença estereotipada pode ser identificada pela presença de uma proposição, geralmente a respeito de um grupo ou categoria social, assim como pela existência de um grande número de pessoas que aderem e consideram aceitável o conteúdo expresso pela proposição

Fonte: Pereira, Marcos E. Os dois mundos da ufologia: crenças sobre os objetos voadores não-identificados e sobre os extraterrestres. Manuscrito ainda não publicado
Atualizado para a aula do dia 19/03/2009 (FCH391)