Resenha: O brasileiro, o racismo silencioso e emancipação do afrodescendente

Viviane Martins

O Ensaio “O brasileiro, o racismo silencioso e emancipação do afrodescendente”, escrito em 2002 pelo psicólogo, doutor em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento, Ricardo Ferreira trata sobre como o racismo sutil foi estabelecido no Brasil e como se constitui a identidade do negro em nosso país. O autor utiliza a história de uma família constituída por pessoas negras a fim de ilustrar o texto. Ferreira inicia seu Ensaio trazendo a questão da democracia racial brasileira como sendo uma farsa e um entrave para o combate ao racismo
e ao preconceito racial no Brasil. Algumas pesquisas apontam que 90% dos brasileiros acreditam que o racismo existe e conhecem pessoas racistas, porém apenas 10% das pessoas pesquisadas afirmaram ter preconceito racial, ou seja, ele é atribuído, na maioria dos casos, ao outro. Dessa forma, dificulta-se o enfrentamento, já que as pessoas não admitem possuir esse tipo de atitude.

O autor cita o “gradiente de cor” existente na população negra, usando o exemplo da família citada; as três mulheres da família não se autoafirmavam negras – uma se dizia branca, a outra morena e a última, mulata. Apenas a partir das experiências de discriminação racial e do contato com a militância, todas passaram a se reconhecerem como negras. O preconceito racial, de um modo geral, não é tratado abertamente nas famílias. Pelo contrário, denominar o negro de moreno parece ser politicamente correto. O autor relembra que a identidade é construída a partir das interações sociais, então o silenciar sobre o preconceito racial vivenciado pelo afrodescendente contribui para a introjeção de valores negativos em relação a si mesmo e ao seu próprio grupo.

Posteriormente, o autor apresenta aspectos históricos, os quais ele acredita ter contribuído com a instalação do preconceito no Brasil. O primeiro deles é a própria Modernidade, tendo como marco inicial o período das Grandes Navegações e a descoberta do Novo Mundo. A Modernidade trouxe a necessidade de ordem e progresso e para isso, foi adotada, de forma exacerbada, a estratégia de classificar que, para o
autor, significa “incluir o semelhante no padrão desejável e excluir o diferente”. Consequentemente, a intolerância torna-se característica básica das práticas modernas, tornando possível o genocídio. O holocausto judaico é apresentado como exemplo. Ele traz também a escravidão no Brasil como exemplo de um genocídio que ele chama de silencioso: “a experiência da escravidão no Brasil transformou o africano em escravo, o escravo em negro, e o negro numa pessoa destinada a ‘desaparecer’, em nome da constituição de um povo cordial e moreno.”

O segundo aspecto histórico foram as ideias de branqueamento defendidas no início do século XX por intelectuais e cientistas, legitimando a ideia de inferioridade do negro. Estas ideias previam a extinção do negro no Brasil e a imigração do branco europeu a fim de favorecer essa extinção.

O autor delimita três condições que tornaram possível o desenvolvimento do preconceito e sua forma de expressão no referido país: a primeira é a desvalorização e eliminação do diferente em nome da busca pela ordem; a segunda, o processo histórico de escravização do negro africano, reduzindo-o a um mero objeto de uso; a terceira e última consistiu na disseminação de ideias, legitimadas pela ciência, que afirmavam a inferioridade do negro e previam a sua extinção. Na década de 1930, Gilberto Freyre formula o mito da democracia racial, contribuindo com a forma de expressão do preconceito racial à brasileira.

Ferreira coloca ainda em seu Ensaio que o mundo utiliza como referência o padrão branco, o negro acaba por utilizar a referência desse padrão branco na constituição de sua identidade, desvalorizando o “mundo negro” e, consequentemente, desvalorizando a si próprio. A escola acaba sendo conivente e até servindo como espaço para que essa suposta inferioridade do negro seja ratificada. Além disso, o negro é responsabilizado pelos problemas etnorraciais, ou seja, os problemas socioeconômicos enfrentados pelos negros é de responsabilidade apenas deles, esquecendo-se o processo histórico e as questões sociais que ocasionaram esses problemas, de fato. O autor considera também que o padrão de beleza que impera na sociedade é o padrão branco. Dessa forma, o indivíduo negro tem a sensação de não pertencer a nenhum grupo, portanto se sente desvalorizado socialmente. O texto afirma que pesquisas apontam que pessoas submetidas à discriminação tendem a apresentar baixa autoestima, autoconceito pobre, ansiedade e depressão. Porém, se o negro toma consciência dessa desvalorização, ele pode iniciar um processo de enfrentamento, valorizando-se por suas
características raciais. A partir das experiências discriminatórias, o negro é obrigado a pensar sobre as questões raciais, o que acaba proporcionando a desarticulação com o mundo simbólico e uma série de sentimentos “negativos”, que o movem para a ação. Nesse momento, o negro pode vir a praticar o preconceito contra o branco. Ele ainda enxerga a identidade negra como algo externo e acaba por se comportar de forma estereotipada, ou seja, como acha que o negro deve agir. O indivíduo se apega exageradamente a símbolos da cultura negra e acaba por excluir o diferente. Segundo o autor, nesse momento, o negro ainda não está constituindo a nova identidade a partir dos valores negros, mas a partir da desvalorização e exclusão dos padrões brancos. Com o passar do tempo, o indivíduo torna-se menos radical e abandona a visão idealizada e romântica em relação à negritude. Ferreira afirma que “a ‘nova identidade’ construída possui três funções dinâmicas: defender e proteger a pessoa de agressões psicológicas; prover um sentido de pertença e ancoradouro social; e prover uma fundação, ou ponto de partida, para transações com pessoas de culturas diferentes daquelas referenciadas em matrizes africanas.”
Na última sessão do texto, o autor coloca algumas propostas em pauta: a realização de um debate no contexto escolar sobre o preconceito e as páticas discriminatórias, já que a escola é responsável pela formação e educação; a participação do negro em grupos de militância, com o fim de que a vergonha de ser negro, se transforma em orgulho de ser negro; a ampliação do debate na academia e a contribuição da Psicologia no
combate à discriminação; por fim o autor propõe “que a pessoa branca deixe de negar suas raízes culturais africanas e indígenas, assim como o negro brasileiro, sua raízes culturais europeias e também indígenas.”

Ferreira conclui o texto afirmando que aceitação da alteridade é condição fundamental para que haja a reversão do preconceito. Quando o autor coloca os aspectos históricos, a interpretação possível é que o ato de classificar e a necessidade de ordem surgiram junto com a Modernidade, sendo esta responsável até mesmo por genocídios. Sabe-se que o ato de classificar é inevitável ao ser humano e é necessário, pois simplifica nossa vida no mundo. A estratégia de classificar é tão antiga quanto a própria vida em sociedade ou em grupo, assim como a necessidade de ordem. Desde o princípio da humanidade existe a necessidade de se ordenar, como por exemplo, é o caso da divisão de papeis desde a Pré-história que, provavelmente, tinha a função de manter certa ordem. Na Idade Média, os romanos classificavam como “bárbaros” todos os estrangeiros. Certamente, essa nomenclatura era carregada de preconceitos em relação aos estrangeiros, o que significa que a intolerância não é característica restrita à Idade Moderna. Outro aspecto a ser considerado é questão da possibilidade do genocídio que, segundo Ferreira, foi proporcionada pela Modernidade. Sabe-se que as Cruzadas promovidas pela Igreja em nome de Deus foram verdadeiros genocídios. Centenas de pessoas foram mortas nas Cruzadas em nome também de uma ordem, da evitação e combate ao “caos”. Uma verdadeira eliminação do diferente, daquele que não estava de acordo com os padrões delimitados pela Igreja. Ferreira trata da escravidão no Brasil como um genocídio silencioso; provavelmente ele não considerou, neste Ensaio, as inúmeras e frequentes mortes de negros africanos, sobretudo, nos navios negreiros que transportavam os africanos de forma bastante precária e até desumana. Foi um genocídio nada silencioso. O autor descreve um processo de construção identitária do negro brasileiro (que ele chama de afrodescendente) sem deixar claro uma
fundamentação teórica e empírica consistente. Além disso, a forma de construção dessa identidade descrita no texto parece uma ideia generalizada e, o que é mais grave, padronizada. Os movimentos negros mais incisivos e radicais são tratados no texto como românticos e idealizadores da negritude, possuidores de atitudes preconceituosas em relação aos brancos. Para o autor, os militantes desse tipo de movimento estão em fase de transição no processo constituinte de sua identidade. Essas afirmações podem ser facilmente negadas: a supervalorização da cultura negra afrobrasileira não constitui uma forma de desvalorizar a cultura branca, pois esta já está supervalorizada. Não pode se utilizar as mesmas estratégias para grupos socialmente e historicamente diferentes. Faz-se necessária uma forma de reparação do grupo oprimido social, economica e historicamente. As possíveis soluções para o combate ao preconceito e discriminação racial apresentadas pelo autor possuem eficácia duvidosa. Atualmente, sabe-se que a melhor forma de diluição do preconceito é tratá-lo de forma indireta, utilizando-se a estratégia grupal da aprendizagem colaborativa.
Apesar de apresentar algumas lacunas, este Ensaio traz ideias bem estruturadas, e os argumentos usados para explicar o motivo da forma de expressão do preconceito racial no Brasil estão bem colocados, de forma a convencer o leitor; ele parece atingir o objetivo ao qual se propõe.

Ferreira, R. F., O Brasileiro, O Racismo Silencioso e Emancipação do Afrodescendente. Psicologia & Sociedade; 14 (1): 69-86; jan/jun. 2002.

Resenha – Trajetórias escolares, corpo negro e cabelo crespo: reprodução de estereótipos ou ressignificação cultural?

Marta Silva Dantas de Matos

O artigo fonte dessa resenha é produto da tese de doutorado em antropologia “Corpo e cabelo como ícones de construção da beleza e da identidade negra nos salões étnicos de Belo Horizonte” (Gomes, 2002). A autora embasa sua discussão nos depoimentos de mulheres negras frequentadoras de salões de beleza étnicos. Destaca o papel da escola como um ambiente de reprodução dos estereótipos sociais dirigidos ao corpo e ao cabelo e como o racismo, presente também na trajetória escolar, pode deixar marcas que ficam visíveis até a vida adulta. Os depoimentos coletados apontam a escola como um ambiente onde acriança negra entra em contato com o racismo e com a discriminação. O segundo ambiente de socialização é também o lugar no qual a criança conhece o outro, a diferença e a desigualdade. Essa é uma discussão relevante, pois, desvincula a imagem da escola de um lugar livre de desigualdades, colocando-a como um ambiente social de produção e reprodução de preconceitos e discriminação. Altera também a imagem das crianças, apresentando-as como reprodutoras de estereótipos já
cristalizados na sociedade. Se o negro está fisicamente na sala de aula ele também precisa está representado nos livros didáticos, nas disciplinas, na cultura escolar, nos murais e em tudo que envolva as atividades pedagógicas, curriculares e extracurriculares da escola. É preciso repensar o local destinado aos negros no processo de ensino com o intuito de construir imagens positivas de identificação durante o processo de
escolarização. Na escola, além de português, matemática, geografia e história, as crianças aprendem e diferenciam o “bom” e o “belo”. A autora propõe que para que as experiências dos negros sejam articuladas com as experiências escolares é preciso que os primeiro sejam ouvidos atentamente. Assim, a relação da negra com o cabelo é aqui apresentada como um dos temas norteadores da resignificação das práticas pedagógicas e dos conteúdos tratados no universo escolar. É uma tentativa de aprofundamento e valorização. A escola enquanto um
ambiente de formação de pessoas e de Identidades precisa contemplar todas as formas de existir que formam a cultura brasileira.
O corpo é um objeto de expressão. É o meio que usamos para mostrar ao outro os nossos gostos e a nossa trajetória. É sabido que o corpo e o cabelo do negro são elementos de denuncia, luta, resistência e marcas.
Porém, a escola precisa está atenta ao apresentar isso. Não se pode anunciar apenas um lado da história e subtrair da fala e das práticas a história de um povo que usou o corpo como mecanismo de resistência e o cabelo como denúncia da sua inconformidade (ou conformidade) com o ideal de beleza pré-estabelecido.
A história e a biologia sempre apresentaram as especificidades do corpo negro que serviram como justificadoras da escravidão. Agora, o que precisa ser apresentada são as modificações, as artes, os enfeites
e as alegorias usadas e feitas no corpo como forma de identidade e pertencimento grupal. Nos depoimentos utilizados, a trança surge como técnica de opressão capilar e o alisamento como uma forma de sanar a dor causada pela produção da trança. Não se pode esquecer, porém, que optar pelo cabelo liso não é somente escapar da dor, mas também corresponder ao padrão desejado de beleza.
A escola impõe um modelo higienista e a trança surge como um modo de cuidar e arrumar do cabelo na tentativa de romper com os estereótipos do negro descabelado e sujo. Além disso, a trança é resignificada e passa a ser um estilo negro de penteado e adorno diferente dos usados pelas crianças brancas. Na escola além de ocorrer o primeiro contato com a alteridade, com a discriminação e com o que é normativo, estabelecem-se tensões entre a
vida privada e a vida pública e as crianças aprendem que o cabelo bom é o liso e que o crespo é ruim e indesejável. Na escola a criança vive as primeiras experiências públicas de rejeição do corpo. Se no
ambiente escolar há a possibilidade da discriminação gerar uma baixa autoestima e sentimentos de inferioridade, com os iguais, existe a possibilidade de construção de uma autoimagem positiva de si e do seu
grupo e a criação de estratégias para lidar, por exemplo, com o cabelo. A autora sugere que por estar ligada ao contexto cultural, histórico e político, a subjetividade e a construção da identidade negra passam
por processos coletivos e individuais e que por isso cada sujeito encontra uma forma de lidar com as questões que envolvem sua raça. Nesse contexto, a informação é umO artigo fonte dessa resenha é produto da tese de doutorado em antropologia “Corpo e cabelo como ícones de construção da beleza e da identidade negra nos salões étnicos de Belo Horizonte” (Gomes, 2002). A autora embasa sua discussão nos depoimentos de mulheres negras frequentadoras de salões de beleza étnicos. Destaca o papel da escola como um ambiente de reprodução dos estereótipos sociais dirigidos ao corpo e ao cabelo e como o racismo, presente também na trajetória
escolar, pode deixar marcas que ficam visíveis até a vida adulta. Os depoimentos coletados apontam a escola como um ambiente onde a criança negra entra em contato com o racismo e com a discriminação. O
segundo ambiente de socialização é também o lugar no qual a criança conhece o outro, a diferença e a desigualdade. Essa é uma discussão relevante, pois, desvincula a imagem da escola de um lugar livre de
desigualdades, colocando-a como um ambiente social de produção e reprodução de preconceitos e discriminação. Altera também a imagem das crianças, apresentando-as como reprodutoras de estereótipos já
cristalizados na sociedade. Se o negro está fisicamente na sala de aula ele também precisa está representado nos livros didáticos, nas disciplinas, na cultura escolar, nos murais e em tudo que envolva as atividades pedagógicas, curriculares e extracurriculares da escola. É preciso repensar o local destinado aos negros no processo de ensino com o intuito de construir imagens positivas de identificação durante o processo de escolarização. Na escola, além de português, matemática, geografia e história, as crianças aprendem e diferenciam o “bom” e o “belo”. A autora propõe que para que as experiências dos negros sejam
articuladas com as experiências escolares é preciso que os primeiro sejam ouvidos atentamente. Assim, a relação da negra com o cabelo é aqui apresentada como um dos temas norteadores da resignificação das
práticas pedagógicas e dos conteúdos tratados no universo escolar. É uma tentativa de aprofundamento e valorização. A escola enquanto um ambiente de formação de pessoas e de Identidades precisa contemplar todas as formas de existir que formam a cultura brasileira. O corpo é um objeto de expressão. É o meio que usamos para mostrar ao outro os nossos gostos e a nossa trajetória. É sabido que o corpo e o cabelo do negro são elementos de denuncia, luta, resistência e marcas. Porém, a escola precisa está atenta ao apresentar isso. Não se pode anunciar apenas um lado da história e subtrair da fala e das práticas a história de um povo que usou o corpo como mecanismo de resistência e o cabelo como denúncia da sua inconformidade (ou conformidade) com o ideal de beleza pré-estabelecido. A história e a biologia sempre apresentaram as especificidades do
corpo negro que serviram como justificadoras da escravidão. Agora, o que precisa ser apresentada são as modificações, as artes, os enfeites e as alegorias usadas e feitas no corpo como forma de identidade e
pertencimento grupal. Nos depoimentos utilizados, a trança surge como técnica de opressão
capilar e o alisamento como uma forma de sanar a dor causada pela produção da trança. Não se pode esquecer, porém, que optar pelo cabelo liso não é somente escapar da dor, mas também corresponder ao padrão
desejado de beleza. A escola impõe um modelo higienista e a trança surge como um modo de cuidar e arrumar do cabelo na tentativa de romper com os estereótipos do negro descabelado e sujo. Além disso, a trança é resignificada e passa a ser um estilo negro de penteado e adorno diferente dos usados pelas crianças brancas. Na escola além de ocorrer o primeiro contato com a alteridade, com a discriminação e com o que é normativo, estabelecem-se tensões entre a vida privada e a vida pública e as crianças aprendem que o cabelo bom
é o liso e que o crespo é ruim e indesejável. Na escola a criança vive as primeiras experiências públicas de rejeição do corpo. Se no ambiente escolar há a possibilidade da discriminação gerar uma baixa autoestima e sentimentos de inferioridade, com os iguais, existe a possibilidade de construção de uma autoimagem positiva de si e do seu grupo e a criação de estratégias para lidar, por exemplo, com o
cabelo.
A autora sugere que por estar ligada ao contexto cultural, histórico e político, a subjetividade e a construção da identidade negra passam por processos coletivos e individuais e que por isso cada sujeito
encontra uma forma de lidar com as questões que envolvem sua raça. Nesse contexto, a informação é um elemento importante para a autoaceitação. A conclusão do artigo é esperançosa ao afirmar que a escola pode atuar tanto na reprodução de estereótipos sobre o negro, o corpo e o cabelo, quanto na superação dos mesmos. Para isso, elas terão que ser consideradas temáticas merecedoras de um lugar nos currículos e em nas discussões pedagógicas. É necessário também entender a construção da questão racial na subjetividade e no cotidiano dos indivíduos e o peso da educação escolar nesse processo. O cabelo e a cor da pele podem – e devem – sair do lugar da inferioridade e ocupar o lugar da beleza negra, assumindo uma significação política. O cabelo compõe um estilo político, de moda e de vida.

Gomes, N. L. (2000). Trajetórias Escolares, Corpo Negro e Cabelo Crespo: Reprodução de Estereótipos ou Ressignificação Cultural? Revista Brasileira de Educação, Set-Dez, nº 21, São Paulo, Brasil, pp.40-51.

Resenha: Estilo de vida como indicador de saúde na velhice.

Juliana Amorim de Souza

O artigo inicia falando sobre um novo fenômeno social: a saída do indivíduo produtivo para a aposentadoria, que o torna ao mesmo tempo idoso. Esse fenômeno possui diversas implicações, tendo como principal a imagem preconceituosa e estereotipada que se faz do velho, como um sujeito inútil a sociedade que não produz e tem que ser mantido pelos mais jovens. Além das implicações sociais, existem as implicações psicológicas que vão desde uso deficitário das funções cognitivas até a redução de trocas relacionais e com o meio. Com isso, o idoso é um ser indesejável na sociedade.
Trazendo um aparato histórico, o artigo abortará a história da Geriatria e suas evoluções. O conceito de velhice irá se modificar ao longo das décadas e hoje é relacionada com longevidade. Com os avanços dessa ciência, a expectativa de vida tem aumentado gradualmente, e nos últimos anos, elevado rapidamente. Segundo dados de Paschoal (apud Papaleo Netto, 1996), a expectativa média de vida da população mundial está em torno de oitenta e cinco anos. Viver com saúde tornou um desafio para a Organização Mundial de Saúde (OMS). O que o artigo traz, no entanto, é que as diferenças individuais sofrem dificuldades para se conceituar de modo homogênio, diferentemente do que acontecem nos conceitos de idoso, velhice e produção do envelhecimento humano. Essa afirmação é confirmada quando se avalia os eventos de origem psicológica e social, onde a história pessoal do indivíduo é um definidor para os suas atitudes e o seu encorajamento para essa nova fase da vida: a velhice. Surge assim, na Geriatria o conceito de ‘Envelhecimento Ativo’ que é o processo de aperfeiçoar oportunidades para a saúde, aliando bem estar físico com bem estar psicossocial. Essa aliança da saúde corporal com a saúde mental promove uma participação ativa do idoso na sua vida, promovendo também uma qualidade de vida elevada.
Conceitos de senescência e senilidade são apresentados no texto. A senilidade é o envelhecimento patológico, que leva a doenças crônicas e quadro neurodegenerativos graves, como a demência. Essas doenças do envelhecimento e o início de doenças crônicas podem ser prevenidos ou retardados (WHO,2002:35). Um dos fatores precipitantes da incapacidade funcional está relacionado com a área cognitiva. Estudos tentam traçar o perfil cognitivo do envelhecimento. A dificuldade de classificar os déficits cognitivos está principalmente quando se pesquisa a memória. As falhas mnêmicas, ou falhas de memória, são definidas como alterações funcionais genéricas quando não comprometem a autonomia e a independência de indivíduos idosos. No entanto, o artigo peca ao abordar os malefícios da perda de memória e como ela afeta a vida do indivíduo que com o tempo esquece até mesmo nome de pessoas próximas, como nos casos de pré-morbidez demencial.
O texto segue relacionando as falhas mnêmicas com o estilo da vida do idoso. Descartada a hipótese inicial de demência como causa da falha de memória, percebe que aspectos psicossociais e comunicionais (relação eu-mundo) podem ser a causa para a perda de memória. Observa-se, então, que os declínios no funcionamento cognitivo são disparados pelo desuso, enfermidades, fatores psicológicos e sociais mais do que o envelhecimento em si (Smits e colaboradores (1999)). Isso leva ao autor a uma conclusão oportuna: estilo de vida e cognição compartilham uma estreita relação: a redução da qualidade de um afeta diretamente a qualidade do outro.
O texto chega as suas conclusões finais trazendo que a qualidade de vida e promoção da saúde do idoso devem ser focalizadas na gerontologia. O geriatra precisa aliar o estilo de vida do idoso para ajudá-lo a enfrenta esse novo ciclo vital, onde há o envelhecimento do corpo, mas que a mente não precisa seguir o meu caminho. O que o autor não mencionou foi à ajuda também de outros profissionais para ajudar o idoso, como fisioterapeutas, enfermeiros e psicológico para que o idoso viva mais e melhor.

Referência: Figueiredo, V. L. M., Estilo de vida como indicador de saúde na velhice. Life style as health indicator on ageing. Programa Interdisciplinar de Geriatria e Gerontologia, Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP), Universidade Federal Fluminense (UFF), 2007, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil.

Resenha – Investigações psicológicas no ciberespaço: O impacto do interesse, filiação grupal e conhecimento na adesão às crenças ufológicas.

Graciara Oliveira Silva

Nesse estudo, os autores apresentam uma breve introdução sobre o sistema de crenças, explicando que umas podem ser mais justificadas e, por isso, mais endossadas do que outras. Isso acontece quando a decisão de crer ou não crer é objeto de uma reflexão e crítica aprofundadas, diferente das crenças constitutivas do sujeito que crê, uma vez que a justificação não é tão importante.
Para adentrar nas crenças ufológicas, os autores pontuaram que a princípio nós não duvidamos que somos seres humanos com atributos que nos identificam como tal e diferenciam-nos dos demais seres vivos que se evoluíram no planeta Terra. Nessa perspectiva evolucionista que nos afasta do criacionismo, e também do antropocentrismo, os autores refletem:

Ao mesmo tempo em que temos certeza de que pertencemos a uma espécie que se desenvolveu no planeta Terra, consideramos como justificada a crença que o nosso pequeno planeta ocupa uma posição quase irrisória face à imensidão do universo. Seríamos, então, os únicos entes pensantes nesse imenso universo ou seria mais sensato supor que talvez em uns poucos dentre os milhões de astros celestes tivessem surgido formas de vida e civilizações diferentes das modalidades que conhecemos? (Pereira; Silva; Silva, 2006, p.376).

Nesse sentido, os autores afirmam que as crenças sobre a existência de extraterrestres e civilizações em outros planetas são plausíveis, porém, duvidosas por causa da falta de comprovação, visto que elas são justificadas por “argumentos construídos com base em evidências sobre a presença de objetos voadores não-identificados” (Idem, p.376). Em seguida, refletem mais:

As crenças se referem a entes reais ou elas fazem alusões apenas a potencialidades derivadas dos arrazoados desenvolvidos por mentes humanas? O que possibilita tantas pessoas acreditarem que tais seres existam, que são mais civilizados e nos visitam com freqüência? Por outro lado, como duvidar de que não somos únicos no universo, sem acreditar que eles se encontram entre nós? (Idem, p.376).

Segundo os autores, a justificação para as crenças ufológicas são construídas a partir de observações por meio de registros visuais e audiovisuais dos discos voadores. Por isso, o objetivo desse estudo foi o de “investigar as crenças a respeito de dois entes: extraterrestres e objetos voadores não-identificados” (Idem, p. 376)
Os autores afirmam que as crenças são sustentadas e compartilhadas muito mais pelo “endossamento subjetivo” do que pelo “estatuto epistemológico”e, por isso, a adesão ou o endosso geram repercussões em vários segmentos.
Nessa perspectiva de crenças compartilhadas, os autores optaram por ampliar o número de participantes da pesquisa para a coleta de dados através da internet. Eles defendem que há uma tendência cada vez mais fortalecida de pesquisas reais em ambientes virtuais. Destaco que muitos estudiosos questionam essa divisão entre o real e o virtual, e o conceito de virtualização do pensador francês Pierre Lévy em sua obra O Que é o Virtual (1996), promovendo uma abertura ainda maior para a práticas de tais pesquisas.
A partir do problema de pesquisa de “identificar as diferenças nos padrões de crenças compartilhadas por pessoas envolvidas ou não com grupos de pesquisas ufológicas sobre temas relacionados com a presença de extraterrestres e de objetos voadores não-identificados” (Idem, p.376), os autores conceituaram de uma forma geral as crenças, pontuaram sua importância na psicologia social e apresentaram suas hipóteses.
A primeira hipótese foi a de que o nível de conhecimento sobre os eventos ufológicos seria diretamente proporcional à adesão à crença. Em seguida, apresentaram hipóteses adicionais que desdobraram nas seguintes variáveis: interesse pelo assunto e filiação em grupos de estudo e pesquisa ufológica.
Em resumo, o instrumento de pesquisa utilizado abordou as seguintes categorias: 1) crenças sobre os extraterrestres e a humanidade; 2) crenças sobre as interferências dos extraterrestres no planeta Terra; 3) crenças sobre as relações entre extraterrestres e humanos; 4) crenças sobre os extraterrestres, a ciência e os cientistas; 5) crenças sobre os extraterrestres e as teorias conspiratórias. Segundo os autores, uma interpretação geral dos resultados sugere que:

[…] dentre as cinco modalidades de crenças consideradas, as relativas aos extraterrestres e a humanidade obtiveram um maior grau de adesão, seguida pelas crenças relativas aos extraterrestres, a ciência e aos cientistas. As crenças a respeito das interferências dos extraterrestres no planeta Terra obtiveram um baixo grau de adesão. Os resultados também sugerem que, globalmente, os participantes não aderem ou rejeitam as suposições relativas às teorias conspiratórias ou às crenças acerca das relações entre extraterrestres e humanos (Idem, p. 379).

Os resultados desse estudo apresentaram padrões diferenciados de adesão às crenças. Foi verificado que a primeira hipótese era verdadeira. Porém, “o interesse pelo assunto e, em menor grau, a filiação aos grupos de pesquisa ufológicos, exerceram uma influência mais significativa na adesão às crenças ufológicas que o grau de conhecimento” (Idem, p. 383). Por fim, concluiram que os resultados desse estudo apontam para a possibilidade de “desenvolver modelos preditivos a respeito do grau de adesão às crenças ufológicas” (Idem, p.383) e de continuação em outro estudo.

Pereira, M. E. ; Silva, J. e Silva, P. Investigações psicológicas no ciberespaço: O impacto do interesse, filiação grupal e conhecimento na adesão às crenças ufológicas. Interação (Curitiba), 10, 375-384, 2006.

Notícia do dia: sob máscaras, engraxates de La Paz lutam contra a discriminação

Fonte:http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI5530922-EI8140,00-Sob+mascaras+engraxates+de+La+Paz+lutam+contra+a+discriminacao.html

A Herança Obscura, estereótipos e preconceitos, a Saga

Resenha: A imagem das enfermeiras frente aos estereótipos: uma revisão bibliográfica

Cecília Spínla


As autoras iniciam o texto explicitando a relevância dos profissionais de enfermagem manterem uma comunicação eficiente com os pacientes, mas revela que esta é dificultada pelo estereótipo da profissão que faz com que os pacientes possuam preconceitos com os profissionais.

As autoras afirmam que a profissão sofre estereótipo com relação ao gênero e explica que este sofre contribuição da tradição judaico-cristã que define uma dominação do homem sobre a mulher. Corrobora com este fato o papel da mulher na idade Média que era responsável por atividades de menor complexidade. Nesta ocasião o cuidar médico era reservado aos homens e ás mulheres restava o cuidado e a manutenção da higiene dos doentes e da ordem do ambiente, trabalho considerado sujo para os médicos que na sua maioria eram de famílias abastadas.

O texto identifica também o preconceito social que reserva aos profissionais da área o estigma de indivíduos que não tiveram uma melhor oportunidade de formação profissional.

Segundo o texto, o trabalho de enfermagem foi por muito tempo desenvolvido por mulheres religiosas que se dedicavam aos doentes, realidade que durou até o início do século XVI, quando ocorreu a revolta Luterana e a ascenção do anglicanismo.

Com a queda do catolicismo e a expulsão das religiosas dos hospitais, a Enfermagem, sem mão-de-obra qualificada, passou a ser exercida por mulheres de moral duvidosa que eram submetidas a péssimas condições de trabalho.

É neste cenário que se constrói a imagem da profissão. Doentes que preferem tratar-se em casa para não sofrerem maus tratos, comerem péssimas comidas ou terem que ceder a suborno por parte dos “profissionais” de Enfermagem.

Outro estereótipos relacionando a profissão diz respeito a desvalorização do serviço prestado e a visão da enfermagem como mão de obra barata. Essa visão, segundo Padilha (1998) advém da prática da Enfermagem no Brasil por religiosas, criando o entendimento de que esta prática deveria ser prestados apenas pelo amor de Deus e que a remuneração a esses serviços constituiria-se em ato impuro e mercenário.

É discutido pelas autoras também o papel da mídia na formação da imagem do profissional de Enfermagem. Para as autoras este veículo dissemina a idéia da Enfermeira como símbolo sexual, prejudicando ainda mais a desmistificação desses falsos conceitos perante a da sociedade.

Encontramos também no texto uma reflexão sobre o estereótipo de submissão no âmbito de valor da profissão da Enfermagem com relação a Medicina, o que advém de uma tradição militar que prezava pelo treinamento da enfermeira para agir com fiel observância às ordens médica e atenta ás relações de autoridade.

Com os dados acima apresentados podemos entender o preconceito que sofre a profissão de enfermagem e compreender o porque das autoras do texto trazerem neste artigo a preocupação com a capacidade de escuta e confiança do paciente/doente com esses profissionais. Tendo em vista que as relações estabelecidas sofrem influência de todos os estereótipos acima citados, que são muitas vezes reforçados pela nossa sociedade atual, é esperado que estes profissionais sofram o estigma de inferiores e menos competentes e com isso encontrem dificuldade de ascender profissional e socialmente.

Reforçando esses preconceitos, a nossa sociedade atual tende a reconhecer no médico o único profissional capaz de atender integralmente no âmbito da saúde, ficando todos os demais profissionais a cargo de implementar as ações descritas. Exemplo claro temos na Lei do Ato Médico que busca legitimar a soberania deste profissional em detrimento às outras profissões da área de saúde.

Perde-se com isso a noção da relevância do serviço de enfermagem, que atua no ambiente hospitalar cuidando da evolução dos pacientes, supervisionando e controlando rotinas e suportando os serviços médicos e multidisciplinares dispensados aos pacientes.

As autoras concluem que o combate a este preconceito formado sobre a profissão de Enfermagem pode ser feito primeiramente através da identificação e conhecimento destes na população e posteriormente com a criação de estratégias de enfrentamento e divulgação da verdadeira profissão, revertendo assim ao profissional, a valorização da sociedade pelo
seu trabalho.

Referência: Santos, C. e Luchesi, L. A imagem das enfermeiras frente aos estereótipos: uma revisão bibliográfica.Proceedings of the Brazilian Nursing Communication Symposium, 2002, São Paulo, Brasil

Resenha: Estereótipos sobre idosos: uma representação social gerontofóbica

chamada

Cecília Spínla

As autoras iniciam o texto incentivando uma reflexão sobre estereótipos e trazem alguns conceitos que clarificam o tema para os leitores. Entendido por Ayesteran e Pãez (1987) como “uma representação social sobre os traços típicos de um grupo, categoria ou classe social”, atualmente os estereótipos mais estudados são os étnicos, sendo também muito presente em nosso convívio social os estereótipos de gênero, profissão, classe social e o de ciclo de vida, objeto deste artigo.

As autoras alertam para a complexidade da literatura sobre o tema já que se trata de um “conceito multiunívoco – constructo categorial, generalizador, estável e definidor de um grupo social”.

No caso dos idosos, preconceito oriundo do ciclo de vida do indivíduo, a autora defende que este se caracteriza como uma representação social da gerontofobia, que se define como o “processo de estereotipia e de discriminação sistemática, contra as pessoas porque são velhas” (Staab e Hodges, 1998).

Neste processo se associam ao idoso conceitos e traços negativos associados à incapacidade, fraqueza e inutilidade, percepções pejorativas do fenômeno de envelhecer.

Vale ressaltar que o estereótipo sofre influência direta do contexto cultural em que está inserido, e na nossa atual sociedade vemos reforçado a visão da “velhice como uma doença incurável, como um declínio inevitável, que está votado ao fracasso”.

As autoras apresentam no artigo um estudo realizado na Université de Montreal por Champagne e Frennet que identifica catorze estereótipos mais frequentes em idosos, são eles:

* Os idosos não são sociáveis e não gostam de se reunir;
* Divertem-se e gostam de rir;
* Temem o futuro;
* Gostam de jogar às cartas e outros jogos;
* Gostam de conversar e contar as suas recordações;
* Gostam do apoio dos filhos;
* São pessoas doentes que tomam muita medicação;
* Fazem raciocínios senis;
* Não se preocupam com a sua aparência;
* São muito religiosos e praticantes;
* São muito sensíveis e inseguros;
* Não se interessam pela sexualidade;
* São frágeis para fazer exercício físico;
* São na grande maioria pobres.

A análise da pesquisa chama a atenção para a confusão de conceitos existentes que faz com que os pesquisados destaquem como características da velhice traços de personalidade e fatores socioeconômicos ao invés de características específicas do envelhecimento.

A partir deste ponto podemos refletir sobre a possível existência de mitos sobre o envelhecimento que impedem o estabelecimento de contatos e conhecimento verdadeiros sobre os idosos.

E com base nessa análise a autora conclui o artigo alertando aos leitores a necessidade de atentarmos para os mitos e estereótipos criados sobre a velhice, pois eles estão muitas vezes ligados ao desconhecimento do processo de envelhecimento mas mesmo assim geram enorme sofrimento nos idosos e influenciam fortemente na nossa interação com os idosos.

Referência: Martins, R. M. e Rodrigues, M. L. Estereótipos sobre idosos: uma representação social gerontofóbica. Millenium. Revista do ISPV, 29, 249-254, 2004

O homem que via

Fonte: http://kimjongillookingatthings.tumblr.com/

Meu nome é Khan!

Contribuição: Wilma Ribeiro
Professora do Curso de Psicologia
Faculdade Adventista da Bahia

Meu nome é Khan! Um filme interessante para se analisar os estereótipos e o preconceito étnico. Trata-se da história de Khan (Shahrukh Khan- mesmo sobrenome na vida real), portador da síndrome de Asperger, que quando criança aprende de sua mãe muçulmana que a única diferença que existe entre seres humanos é entre bons e maus. Ao tornar-se adulto vai morar em São Francisco – EUA, casa-se com uma hindu e após o ataque às torres gêmeas – 11 de setembro de 2001 – a sua vida muda completamente. A xenofobia contra muçulmanos acaba tornando a dinâmica social e psicológica da família de Khan insuportável. A jornada de Khan que é apresentada no filme trata-se de sua tentativa de provar que não é um terrorista. Recomendo!