Resenha: Imagens e estereótipos do Brasil em reportagens de correspondentes internacionais.

Zélia Fernandez

O artigo traz uma importante articulação entre a produção dos textos de correspondentes internacionais e os seus efeitos na manutenção dos estereótipos relacionados a imagem do Brasil no exterior. O artigo está dividido nas suas 15 páginas, em quatro partes : na primeira parte o artigo traz o resumo e uma introdução com uma revisão histórica das atividades de correspondências de notícia no Brasil e uma pequena revisão teórica sobre os estereótipos, na segunda parte ele apresenta sua metodologia de pesquisa descrevendo também seu referencial teórico para análise metodológica e que serve de referência para confirmação da sua hipótese de pesquisa. Na terceira parte o autor discute os seus resultados fazendo uma articulação rica entre o quanto a manutenção dos estereótipos é reforçada nessas produções jornalísticas, o papel do profissional nas suas escolhas e as repercussões sócio econômicas da manutenção desses estereótipos. E ao final, as referências bibliográficas.
O autor é I.Paganotti, jornalista freelancer formado pela Universidade de São Paulo, professor de Jornalismo do Colégio Stockler.

Na primeira parte do artigo o autor apresenta o resumo e os primeiros exemplos do tratamento que a imagem do Brasil recebe pela mídia e os instrumentos que serão utilizados para aprofundar o tema, assim como uma revisão histórica das impressões estrangeiras como fonte da identidade nacional.

Ele descreve como historicamente a imagem do Brasil foi sendo construída e a formação de uma idéia de Brasil a partir da perspectiva do olhar estrangeiro, mais especificamente da visão dos correspondentes internacionais, que ele chama dos novos jesuítas, que com seus relatos de viagem são responsáveis por levar as noticias do Brasil para fora.

As reportagens feitas por esses profissionais chega a casa dos milhares anualmente e portanto a construção de uma imagem brasileira, onde se reproduz muitos estereótipos não consegue estar fora da pauta. Nesse sentido são dois brasis que são normalmente descritos nesses relatos: o do paraíso e o do inferno.

O autor faz uma pequena revisão teórica do conceito de estereótipo, citando autores como Lippman e Maisonneuve. Segundo o autor é a partir dos estereótipos presentes nos muitos relatos dos estrangeiros sobre o Brasil, que vão se sustentar a imagem do pais lá fora e ajudar a construir o imaginário coletivo estrangeiro sobre o Brasil.

Na segunda parte do texto ao autor apresenta o método da sua pesquisa. Ele usou como fontes o The New York Times dos EUA, El Mundo da Espanha, Diário de Notícias de Portugal, The Guardian e The Observer da Inglaterra, Página/12 e El Clarín da Argentina.

Analisando 1244 textos e usando como referencial teórico para análise dos textos a análise crítica do discurso, definida por Fairclough como “o exame das conexões implícitas entre as características textuais e os processos sociais (Fairclough, 1997: 97)”, ele procurou aprofundar o quanto havia de reprodução ou transformação dos estereótipos. De acordo com Fairclough se pode utilizar uma estratégia mais normativa, reproduzindo uma idéia por meio da repetição ou mais criativa transformando pela contestação, discussão ou até mesmo negação “os pressupostos e estereótipos apresentados”. Segundo o teórico as manifestações criativas mantidas em longo prazo “podem também alterar permanentemente as próprias imagens, pressupostos ou estereótipos que a opinião pública tem sobre certos temas (idem, 1992: 165)”. O autor se preocupou em procurar detectar sinais de desconstrução da imagem estereotípica que os estrangeiros têm sobre o Brasil, nas suas narrativas.

Na terceira parte do texto o autor discute os seus resultados fazendo uma classificação muita rica dos relatos levantados em quatro grupos temáticos estereotipados. São eles: O Brasil “verde”: concentra-se na exaltação da beleza natural do país, o Brasil “de lama”: que foca a corrupção política, o subdesenvolvimento e a pobreza endêmica e freqüentemente inter-relacionados a o terceiro grupo temático, o Brasil “de sangue”: que é o Brasil da violência, incluindo o tráfico de drogas, que leva a um cenário de insegurança. E finalmente no quarto grupo o Brasil “de plástico”: que é um Brasil muito publicitário, “é a nação das festividades carnavalescas, da liberdade sexual (seja qual for a orientação), dos negócios, da alta sociedade e seus caprichos”.

No artigo há uma tabela onde as quatro categorias temáticas são apresentadas e a freqüência em que cada sub tipo relacionados a elas aparece. Uma conclusão muito interessante do autor é sobre a freqüência de estruturas representativas simplificadoras que aparecem em cada três reportagens, deixando claro que a repetição de estereótipos é mais comum do que a transformação. Uma categoria no entanto, chama mais a atenção como aquela que possui o maior percentual de transformação, com 88, 9% , é o da miscigenação, superando o mito da democracia racial. No entanto a maioria ainda é o da reprodução de estereótipos, com uma predominância do Brasil “sangrento” nas ligações com o tráfico de drogas e em segundo lugar o Brasil “de lama” com grande repetições de estereótipos como a corrupção e a pobreza. Aqui o autor faz uma análise muito apropriada de como a escolha do vocabulário pode influenciar a representação e conseqüentemente pode colaborar com os processos de estereotipia onde se passa a idéia por exemplo de que: “é em meio à pobreza que cresce o banditismo”.

Os estereótipos oferecem uma possibilidade de ajuda aos correspondentes no sentido de dar a eles um caminho simplificador, onde eles possam apenas aprofundar, a sua narrativa.O problema apontado pelo é autor é a permanência ou insistência no uso de certas representações que não dizem respeito mais a realidade e que carece de questionamento e transformação, levando a um déjà vu de pré-conceitos e conceitos ideologicamente enviesados. O autor aponta ainda poucos esforços no sentido do que seria uma prática interessante, que a discussão sobre a utilização de estereótipos, tornando esse mecanismo mais consciente, tanto por parte do jornalista quanto do leitor.

A superação ao longo dos anos de uma narrativa transformadora da imagem de um Brasil exclusivamente sensual, festivo e exótico, portanto reducionista, para uma mais crítico, acabou criando novos estereótipos, onde se enfatiza demais certos aspectos negativos. Nesse ponto do artigo e para finalizar, o autor faz uma interessante articulação entre as repercussões ideológicas e sócio econômicas da utilização desses estereótipos. Ele coloca que a expressão desses estereótipos nas narrativas desses profissionais, os alterando ou os mantendo, tem o efeito de servir a interesses, seja intencionalmente ou não.

Referência: Paganotti, I. Imagens e estereótipos do Brasil em reportagens de correspondentes internacionais. RUMORES – Revista Online de Comunicação, Linguagem e Mídias 1, 1, 2007

Resenha: Teorias Implícitas e Essencialismo Psicológico – Ferramentas Conceituais Para o Estudo das Relações Entre e Dentro dos Grupos

Zélia Fernandez

O artigo traz um aprofundamento nas teorias implícitas e no essencialismo psicológico e o seu efeito nas relações intergrupais. Em doze páginas, os autores fazem uma revisão histórica dos conceitos, percorrendo as contribuições dos vários estudiosos dos temas. Eles não só conceituam mas também descrevem os tipos, as causas e conseqüências dos fenômenos. O artigo esta dividido em duas partes, sendo que cada uma com três tópicos: na primeira parte o artigo mostra uma revisão histórica das teorias implícitas e seu conceito, depois as funções e os tipos, na segunda parte com mais três tópicos, eles abordam o conceito de essencialismo psicológico, também apresentando a contribuição dos diversos autores sobre o tema, as causas e resumidamente seus efeitos. E ao final, as referências bibliográficas.
Os autores são Claudia Estrada Goic da Faculdade de Humanidades, Ciências Sociais e Ciências da Saúde, Miriam Oyarzún Jara da Direção de Assuntos Estudantis, ambas da Universidade de Magallanes no Chile e Vincent Yzerbyt do Departamento de Psicologia Social e Organizacional da Universidade Católica de Louvain na Bélgica,
Na primeira parte do artigo, os autores procuram situar a importância das teorias implícitas e do essencialismo como área de investigação crescente nos últimos anos na psicologia social e a sua participação nos processos psicossociais, destacando a contribuição desses estudos na formação de impressão e nas estratégias cognitivas na apreensão da realidade social. Eles primeiro se utilizam dos usos dos termos para aprofundar o conceito que define as teorias implícitas como um conjunto de crenças sob as quais o sujeito se sustenta para definir como são as pessoas, a natureza humana e os processos sociais. Ele reforça essa conceituação a partir da análise dos próprios termos, teoria e implícita, teoria como um conjunto de crenças consistentes para explicar fenômenos e implícitas porque na verdade aquelas se baseiam em teorias pouco formais, indutivas e pouco consistentes, não tendo portanto, nenhuma relação com as teorias científicas. Ele termina essa primeira parte fazendo uma rápida correlação entre dois conceitos: o das representações sócias e das TI (teorias ingênuas) como ambas tendo cargas motivacionais e afetivas que incitam a ação (Rodrigo, 1994)
Na segunda e terceira partes do artigo os autores tratam das funções e dos tipos de teorias ingênuas. Segundo Levy e colaboradores as TI servem para organizar, compreender e simplificar a realidade social e compartilhar e estabelecer um marco justificativo para as nossas ações e do outro. De forma bem didática, os autores descrevem os tipos de teorias que servem as funções descritas acima. As teorias podem ser: sobre a personalidade, sobre a natureza humana e as que fazem referência a natureza humana mais a origem dos grupos.
A teoria que toma como base a personalidade, se referencia no conhecimento que temos sobre alguém e a forma como utilizamos esse conhecimento para fazer inferências sobre a sua personalidade. Uma das principais contribuições dos autores no entanto é marcar o caráter não particular desse tipo de teoria, isto é, ela pode ser compartilhada, pois possuem elementos comuns e gerais, como por exemplo, todas as pessoas extrovertidas são mais acolhedoras que as introvertidas.
Todas as teorias sobre a bondade, a maldade e a raça humana, por exemplo, fazem parte das teorias ingênuas sobre a natureza humana, esse é um segundo tipo, que seriam crenças gerais mas que podem ainda ser classificadas em dois subtipos: a do locus de controle e as teorias sobre a natureza humana propriamente dita. A teoria do locus de controle é uma das primeiras teorias explicativas da atribuição social, que postula que uma pessoa pode estimar que seu comportamento é provocado, ou por fatores internos (locus de controle interno) ou por fatores externos (locus de controle externo). Ela faz parte dos estudos de alguns fenômenos como por exemplo: a ansiedade como reação ao fracasso (Lefcourt, 1973) e os comportamentos de risco (Hunter, 2002; Miller & Mulligan, 2002),
Dweck e colaboradores propuseram um modelo que explica em quais aspectos da natureza humana as pessoas concentram as suas teorias ingênuas, são elas: a inteligência, o caráter moral, a personalidade e a concepção de mundo. Aí os autores falam das formas como essa aplicação das TI é feita: de uma forma entitativa ou incrementalista, a primeira mais parcial e estabelecendo diagnósticos a partir de inferências, tendem a ver o outro com características mais fixas e menos maleáveis e o segundo, menos parcial, leva em conta fatores situacionais. Duas das várias contribuições importantes do artigo é a correlação entre essas duas formas, das quais um mesmo individuo pode se valer, ora de uma, ora de outra teoria (Dweck e col, 1995) e a confirmação da idéia de que aqueles com maior tendência entitativa recorrem mais aos estereótipos.
Finalmente o último tipo de TI sobre a natureza dos grupos sociais são as que colocam nossas crenças e conhecimentos gerais sobre alguém a partir de sua pertença a um determinado grupo social
No primeiro tópico da segunda parte do artigo, os autores fazem um breve histórico do conceito de essencialismo nas diversas disciplinas como na filosofia, genética e biologia e aprofundam esse histórico mais especificamente na psicologia e mostram as contribuições dos diversos autores nessa área. O termo, primeiro utilizado por Alport(1954) relacionando-o com o preconceito, foi reentroduzido por Medin(1989), que conceitua o essencialismo como a tendência a pensar que há a existência de uma essência ou uma natureza subjacente que fazem com que as coisas ou pessoas sejam como são. Rothbart e Taylor (1992) estudaram e tipificaram o essencialismo e sua influência nas definições de categorizações sociais, ou melhor, a tendência dos observadores, a compreender as categorias sociais como algo natural que comporta uma essência e que tem características estáveis e de pouca maleabilidade, além do seu potencial indutivo, isto é, a possibilidade de prever novas características a partir das conhecidas.
Os autores descrevem as características do essencialismo diante de um grupo, propostas pelo próprio Yzerbyt e Schadron(1996) a partir das proposições teóricas de Rothbart e Taylor(1992), quais são: o grupo como uma unidade, com um destino comum, a inalterabilidade, o caráter indutivo, a existência de una relação causal entre uma essência e todas as características do grupo social e a exclusão de outras formas de conhecimento e apreensão do indivíduo. As características propostas por Estrada(2003) se assemelham as descritas acima e acrescentam que a essência preexiste ao grupo, ela é inferida, imutável, exclusiva e é coerente.

No segundo tópico os autores descrevem as causas do essencialismo, usando como base os trabalhos de Rothbart e Taylor (1992) e Hirschfeld (1995, 1998, 1999). Os primeiros pensavam que o essencialismo se origina em um “erro ontológico”, que é compreender as categorias sociais como categorias naturais, por exemplo a diferença entre ser judeu e cristão é a mesma entre um mineral e um vegetal.
Para Hirschfeld (1995, 1998 e 1999) as pessoas são capazes de organizar uma espécie de reino humano que ajuda a classificar os seres humanos tomando como base diferenças superficiais, por isso algumas categorias tendem a ser mais essencializadas, como raça por exemplo.
No terceiro e último tópico da segunda parte do artigo os autores aprofundam os efeitos do essencialismo nas relações endo e intergrupais . O essencialismo é uma teoría implícita que serve para explicar as diferenças entre os grupos . Estrada e cols. (2004) mostraram como o essencialismo modula o uso de fatores explicativos biológicos e culturais e Martín e Parker (1995) incluíram nesses, os fatores sociais. Leyens e cols (2000-2002) estudaram o fenômeno da infrahumanização, que significa que ao dar ao seu grupo de pertencimento uma característica própria, essencial, humana e superior então para o exogrupo essa essência seria menos humana ou infrahumana e inferior.
Outros aspectos apontados nessa parte do artigo são os efeitos do essencialismo sob os estereótipos e o preconceito como por exemplo no estudo de Bastían e Haslam (2006) que confirmam que as pessoas essencialistas usam mais os estereótipos. A avaliação e o enfrentamento do membro desviante no endogrupo, o fenômeno da projeção social e o efeito do falso consenso são outros aspectos tratados nessa parte do artigo.
Os autores reconhecem que ainda há muito estudo empírico a ser realizado na busca de respostas no que podem ser ferramentas conceituais poderosas, no sentido de aprofundar o estudo e o entendimento das relações intergrupais. As TI representariam um grande potencial explicativo dos fenômenos associados ao pensamento e a dinâmica da interação social, segundo os autores.
Eles apontam caminhos futuros de investigação como o papel que estas crenças desempenham em questões sociais, mais específicas, tais como: a resistência à mudança de jovens com comportamento marginal (em gangues, por exemplo) e a busca de formas de diálogo entre os grupos com idéias radicais (políticas ou religiosas, por exemplo).
O artigo é bastante objetivo e didático no sentido de traçar um panorama geral sobre as principais contribuições dos diversos autores aos conceitos propostos e é de fácil leitura.Ele aborda de forma organizada e detalhada os conceitos e é uma boa referência para aqueles interessados na abordagem de conceituações relacionadas a expressão dos estereótipos e nas relações intergrupais, sobre as quais ele incita a um aprofundamento maior por parte dos investigadores.

Referência: Estrada, C., Oyarzún, M e Yzerbyt, V. Teorías Implícitas y Esencialismo Psicológico: Herramientas Conceptuales Para el Estudio de las Relaciones Entre y Dentro de los Grupos. Psykhe, 16, 2, 2008, 139-149

Resenha: Dizer não aos estereótipos sociais: as ironias do controle mental.

Wilma Ribeiro

Quem consegue escapar dos estereótipos? Portugueses, brasileiros, italianos, taxistas, garçonetes, políticos, todos os grupos existentes possuem seus esquemas categóricos e, portanto, seus estereótipos. Todos nos encontramos em categorias sociais que por sua vez são estereotipadas. Estereótipos são, sem dúvida, estruturas cognitivas úteis no nosso cotidiano. Rápidos, automáticos, espontâneos, naturais, nos fazem economizar recursos cognitivos e simplificar nossa realidade. Em contrapartida, nossos preconceitos se encontram em maior ou menor medida associados a um estereótipo. Seria possível controlar o pensamento estereotípico com eficácia? O artigo de Bernardes (2003) trata do suporte teórico dos mecanismos de supressão do estereótipo e das conseqüências da utilização do mesmo.
O estereótipo refere-se a crenças e conhecimentos a respeito de determinado grupo, que podem influenciar as percepções e os comportamentos relacionados ao mesmo e aos seus membros. Um problema pode surgir quando os estereótipos fazem com que um indivíduo afaste ou rejeite outro por este pertencer a determinada categoria, sem que este último tenha a chance de se fazer conhecer efetivamente com suas qualidades e limitações. Por exemplo, você pode desconsiderar Karla em uma entrevista de emprego de uma empresa, por ser mulher, e perder uma fiel e competente funcionária. Os estereótipos levaram a tomar esta decisão.
Será que uma supressão do estereótipo resolveria este problema? De acordo com o artigo de Bernardes (2003), a tentativa de inibir os pensamentos estereotípicos de acederem à consciência (supressão) pode resultar em efeitos indesejados. Se reiteradas vezes um pensamento é detectado conscientemente a fim de que se possa suprimi-lo, o resultado pode ser a hiperacessibilidade do mesmo, fazendo com que se torne mais acessível do que se não tentasse suprimi-lo. Este é o chamado efeito de ricochete (ERE). Este efeito foi observado nos experimentos realizados em que havia uma supressão explícita (Pedia-se ao participante para não pensarem em estereótipos) e em situações em que a supressão era induzida pela situação (Avaliador pertencia ao grupo a ser estereotipado pelo participante).
A autora também aponta alguns estudos que relacionam estereotipização e memória, citando dentre eles o de Macrae et al (1996). Tais estudos sugerem que a supressão do estereótipo requer recursos atencionais da parte dos indivíduos. Em situações de supressão em que informações estereotípicas e não estereotípicas estavam disponíveis, os participantes posteriormente lembravam-se mais daquelas estereotípicas. O ato de suprimir o estereótipo pode impedir o processamento e retenção da informação não-estereotípica.
Somos, portanto escravos dos estereótipos? Não. A autora aponta alguns autores dentre eles Monteith et al. (1998) que advogam que nem sempre a supressão leva a efeitos irônicos. Um fator moderador relaciona-se a atitude pessoal relacionada a que tipos de grupos estão sendo estereotipados. Por exemplo, estereotipar pedófilos é diferente de estereotipar mulheres, uma vez que para esses últimos há normas pessoais e sociais contra a aplicação de estereótipos. Assim, “quando os indivíduos são instruídos a suprimir os estereótipos dos grupos para os quais não têm preocupações sociais e pessoais acerca da estereotipização, o subsequente ERE poderá não ocorrer.” Ademais, foi verificado que entre os indivíduos com um baixo nível de preconceito havia uma grande probabilidade da ativação dos estereótipos não chegar a se concretizar. E mesmo que esta ocorra, a motivação dos mesmos e o sentimento de culpa subjacente, leva-os a evitar reações estereotípicas. O processo de supressão de pensamentos estereotípicos pode se tornar automático através da prática. Além disso, a negação das associações estereotípicas também facilita a inibição da ativação do estereótipo após a categoria social ter sido apresentada.
A autora também aponta para outras estratégias que podem ser utilizadas de maneira eficaz no momento em que se deseja evitar um estereótipo: a substituição dos pensamentos estereotípicos por outros (por crenças igualitárias, por ex.) e a individuação do alvo (formar impressões com base em informações individuais sobre o alvo). Verifica-se também que aqueles indivíduos que estabelecem o objetivo de não serem preconceituosos, podem viabilizar a não ativação dos estereótipos.
Ao considerar os efeitos negativos das crenças estereotípicas surge a necessidade de evitá-las. Estas vão de encontro às normas de igualdade e de justiça, em especial em uma sociedade dita democrática. Além disto, estas crenças conduzem a um sentimento de culpa em pessoas que possuem senso de justiça e uma visão aberta da realidade. Seria, portanto muito interessante se pudéssemos simplesmente dizer a nós mesmos para não sermos preconceituosos e automaticamente todos os nossos estereótipos negativos desaparecerem. Desta forma especificamente não. Mas a depender das condições, motivações e objetivos podemos fazer uso não apenas da supressão como também das outras estratégias para evitar o impacto dos estereótipos sociais.

Referência: Bernardes, D. Dizer não aos estereótipos sociais: as ironias do controle mental. Análise Psicológica. 21,3, 307-321, 2003.

Preconceitos contra nordestinos

Contribuição: Elva Valle

Resenha: publicidade contra-intuitiva e o efeito ricochete

Elva Valle

O artigo é dividido em quatro partes (tópicos): introdução, efeitos esperados, a publicidade contra-intuitiva e o efeito ricochete, considerações finais. O objetivo principal é discutir o papel da propaganda como meio divulgador de idéias, tanto para manter, como, para alterar conceitos estereotipados em relação a grupos minoritários. Para promover essas mudanças, seria então utilizada a propaganda contra-intuitiva, uma tentativa de romper com crenças estereotipadas. Mas, esse formato acarretaria, em alguns casos, consequências negativas: o efeito ricochete.
Para o melhor entendimento do texto, os autores trazem definições de termos relevantes: estigma, crença, estereótipos e preconceito. Estigma seria um atributo depreciativo, uma marca que faz com que o indivíduo estigmatizado, aos olhos dos outros, seja menos humano. As crenças seriam aquilo que é aprendido desde a infância (nos diferentes contextos: casa, escola, meios de comunicação), e é adotado como verdade. Estereótipos seriam crenças coletivamente compartilhadas. E preconceito seria uma atitude emocional e racional, negativa e injusta, em relação a um grupo, ou indivíduo membro de determinado grupo. As atitudes preconceituosas seriam o resultado da combinação de estereótipos negativos e crenças pessoais.
Através da utilização de contra-estereótipos, seria possível promover nos receptores uma alteração de crenças enraizadas. É importante também salientar, que a propaganda contra-intuitiva não se afasta do objetivo mercadológico da propaganda; assim essas produções cumprem, além da função de mercado, uma função social ao estimular o indivíduo a desenvolver uma nova postura em relação aos grupos estereotipados. Pesquisas mostram que indivíduos com baixo grau de preconceito são mais propensos a substituir pensamentos negativos, devido a motivações mais igualitárias. Portanto, a propaganda contra-intuitiva funcionaria melhor com esses indivíduos.
Para se ter o efeito persuasivo da mensagem, o papel do indivíduo receptor é importante: é necessária a simetria entre mensagem, informações (conhecimentos prévios) do receptor, e motivação para assimilar o que foi apresentado. Como o discurso contra-intuitivo almeja uma nova construção (ou desconstrução) da realidade, os efeitos esperados seriam aumentar a revisão e formação de pensamentos objetivos, atualizando o olhar social para crenças arcaicas. Mas também um efeito contrário ao desejado poderia ocorrer, o chamado efeito ricochete. Ou seja, em algumas circunstâncias, poderia reforçar os pensamentos preconceituosos, podendo sugerir também que o personagem estigmatizado não poderia ter a realidade apresentada (de prestígio) e por isso a situação seria engraçada.
É importante não esquecer o papel o da comunicação social na esfera social, como influenciador e “(trans)formador” de opinião, e a isso deve ser dar um olhar críticos nas propagandas atuais. A propaganda tem um poder de reforçar preconceitos ou promover novos valores. E seu papel influenciador da publicidade foi estudado diversas vezes, como por exemplo, a propaganda “educativa”, que ensinou a sociedade a consumir e conviver com novas tecnologias como sabonete, geladeira etc.
Contudo, alguns pontos relevantes ficaram de fora da análise desse artigo, como a não-aceitação da imagem contra-estereotipada, que foi o caso do comercial das Havaianas com a vovó, que por solicitação de parte da audiência, foi retirado do ar. Seria importante também uma análise mais profunda do comercial escolhido. O exemplo citado é da propagada “Está na hora de rever seus conceitos” do Novo Fiat. Onde coloca um personagem negro numa posição de prestigio, casado com uma loira. O personagem está apenas como pano de fundo, não abre a boca durante todo o comercial. Essa seria realmente uma propaganda contra-intuitiva? Outro ponto, também não abordado, é a questão do uso de protótipos versus estereótipos; o uso de protótipos nos comerciais é de certa forma bastante funcional, e por ser um protótipo, pode carregar pouco ou nenhum estereótipo.
De maneira geral, o texto aborda conceitos teóricos importantes, e também apresenta de forma clara as idéias da propaganda contra-intuitiva, revelando que, apesar de possíveis efeitos negativos, esse formato é bastante positivo na desconstrução de crenças estereotipadas.

Referência: LEITE, Francisco; BATISTA, Leandro Leonardo. A publicidade contra-intuitiva e o efeito ricochete. Revista Galáxia, São Paulo, n. 15, p. 155-166, jun. 2008. Disponível em: http://200.144.189.42/ojs/index.php/galaxia/article/view/5739, último acesso em 14 de dezembro de 2011

O risco de ir a um concerto punk em Aceh, Indonésia


Fonte: www.elpais.es

Resenha: as novas formas de expressão do preconceito e do racismo

Wilma Ribeiro

Atualmente encontramos novas formas de expressão do preconceito e do racismo, que corporifica muitos comportamentos cotidianos de discriminação sendo estes ocorridos ao nível institucional, ou ao nível interpessoal como trata o artigo de Lima e Vala (2004). O objetivo do artigo é analisar as várias teorizações produzidas pela Psicologia Social que explicitam as novas formas de expressão do preconceito e do racismo. Dentre estas pode-se citar: os racismos moderno e simbólico da Austrália e dos EUA; os racismos aversivo e ambivalente dos EUA; o preconceito sutil da Europa; e, finalmente, o racismo cordial do Brasil. O racismo simbólico “se baseia em sentimentos e crenças de que os negros violam os valores tradicionais americanos do individualismo ou da ética protestante”. Já o racismo moderno guarda elementos comuns com o racismo simbólico e envolve a percepção de que os negros violam valores que são considerados importantes para os brancos e ainda recebem mais do que são merecedores. O racismo aversivo é considerado como decorrente da coexistência de um sistema de valores igualitários com sentimentos e crenças negativos direcionados aos negros. Por sua vez, o racismo ambivalente aborda a ambivalência de sentimentos na expressão do racismo. O artigo trata também sobre o preconceito sutil como uma forma mais velada e disfarçada de preconceito, e o racismo cordial como aquele que caracteriza o encontrado na sociedade brasileira. Sobre este último falaremos mais adiante. O artigo de Lima e Vala (9999) estabelece a diferenciação entre dois fenômenos distintos mais relacionados um ao outro: o preconceito e o racismo. O preconceito se refere a uma atitude hostil contra um indivíduo pertencente a um grupo desvalorizado socialmente. Dentre as várias formas de preconceito, encontramos o étnico ou racial “que se dirige a grupos definidos em função de características físicas ou fenotípicas supostamente herdadas”. Já o racismo constitui-se num processo de “exclusão e discriminação contra um indivíduo ou toda uma categoria social que é definida como diferente com base em alguma marca física externa, a qual é re-significada em termos de uma marca cultural interna.” O racismo é apontado como fenômeno que repousa sobre uma crença na distinção natural entre grupos. Mas afinal, quem é preconceituoso no Brasil? Os autores apontam para os dados de uma pesquisa realizada junto a uma amostra nacional indicando que quase 90% dos entrevistados se considera não racista. É bom pensar, entretanto, que não se é racista, uma vez que este termo caminha atrelado a outras características negativas como desumano, frio, etc. Mas a pesquisa continua demonstrando dados interessantes e contraditórios, pois ao passo em que esta alta porcentagem de brasileiros se considera não racista, a mesma quantidade de pessoas acredita que existe racismo no Brasil (Turra & Venturi, 1995). Onde estão os preconceituosos, então? Observa-se que as formas de expressão do preconceito bem como a natureza do mesmo são influenciadas e definidas pelas normas sociais vigentes na contemporaneidade. O artigo aponta para a mudança nos estereótipos relacionados a negros no Brasil com dados coletados na década de 50 e no ano de 2001. O resultado demonstra um decréscimo nos escores dos estereótipos negativos (ex.: preguiçosos e estúpidos) e um aumento nos escores dos positivos (ex.: musicais e alegres). O que poderíamos compreender erroneamente a partir dos dados apresentados é que o preconceito contra os negros diminuiu, e então celebrarmos a igualdade entre raças. Esta inferência não passa de um ingênuo engano. O que se observa hoje são formas sutis e veladas de demonstração do preconceito, enquanto o mesmo continua sendo fortemente vivenciado. Estas demonstrações estão ocorrendo em todo o mundo e no Brasil adquiriu o nome de “racismo cordial”. O Brasil é considerado um país multiracial. A miscigenação encontrada na pele, cultura, religião do povo brasileiro nos fala de um país onde o contato inter-racial, tem sido desde o início da civilização e o é até então, um fenômeno definidor da identidade social. A presença do preconceito neste país difere da dos outros países uma vez que aqui encontramos manifestações polidas de atitudes e comportamentos discriminatórios. Em especial, essas se expressam “ao nível das relações interpessoais através de piadas, ditos populares e brincadeiras de cunho “racial”. Isto é o que podemos chamar de racismo cordial. Assim, em geral, pessoas de cor negra não deixam de ser vítimas do sarcasmo de pessoas que de longe, se consideram preconceituosas. O artigo traz a posição de Guimarães (1999, p. 67), sobre este relevante aspecto: “trata-se de um racismo sem intenção, às vezes de brincadeira, mas sempre com conseqüências sobre os direitos e as oportunidades de vida dos atingidos”. Assim, no lugar de observarmos pessoas sendo xingadas ou agredidas por serem negras, ou sendo expulsas de ambientes restritos, identificamos novas modalidades de discriminação. Embora esteja claro que maneiras mais explícitas de demonstração não tenham deixado de existir por completo. Ademais, algumas expressões como: ‘A coisa tá ficando preta!’, ‘Denegrir a imagem’, ‘Humor negro’, são naturalizadas no vocabulário cotidiano e escondem uma depreciação e desvalorização daquilo que está relacionado com a cor escura, com o negro. Estas formas são mais difíceis de serem identificadas e conseqüentemente mais complexas no que se refere ao seu enfrentamento. Durante décadas o preconceito racial esteve presente na história da humanidade. O questionamento que se instaurou: Como vai a sua manifestação hoje? Pode ser respondido de forma clara. Certamente as leis que obrigam a uma convivência pacífica e penalizam aqueles que manifestam sua aversão a raça do outro tem conseguido uma diminuição dos atos de agressão e exclusão. Mas essas mesmas leis não têm diminuído o preconceito. A literatura aponta para a possibilidade de pessoas preconceituosas mascararem com negação, falseamento ou justificativas seus atos de discriminação. A lei, desta forma, não diminuiu o preconceito e situações discriminatórias ainda continuam perpassando o cotidiano de indivíduos em todo o mundo que nem sempre recorrem aos seus direitos legais. O artigo que faz uma comparação entre os preconceitos existentes no Brasil, Austrália, Europa e EUA, salienta a necessidade de maior ênfase na investigação dessas modernas formas de preconceito no Brasil, a fim de encontrar elementos que diferenciem e assemelhem as maneiras de demonstração preconceituosa existente nesses diferentes países. O anseio pessoal é que as investigações também caminhem para a descoberta de novas e eficazes formas de enfrentamento e diminuição do preconceito.

Referência:  Lima, M. E. e Vala, J. As novas formas de expressão do preconceito e do racismo. Estudos em Psicologia (Natal), 9, 3, 2004.

Estereótipos e política: homem + mulher + amor = família

Contribuição: Apohena Noyora

Estereótipos, adolescentes e a biebermania

Estereótipos e publicidade: crianças não mentem?

Contribuição: Raimundo Gouveia