Foto do dia: Golden Girls (people of the world)

Golden Girls, originally uploaded by Caroline Kross.

Resenha: Aparência física e amizade íntima na adolescência: estudo num contexto pré-universitário

Aruanã Fontes

A adolescência é uma fase da vida marcada tipicamente por intensas transformações fisiológica, anatômicas, psicológicas e sociais caracterizando a passagem da infância para a fase adulta. No que tange às mudanças psicossociais, o conhecimento de si e o fortalecimento das amizades estão em vigência para o adolescente, e se torna alvo de vários estudiosos. Para Cordeiro (2006) estes aspectos são os mais importantes deste período por isso ele elabora um estudo, relatado no seu artigo “A aparência física e amizade íntima na adolescência: Estudo num contexto pré-universitário”.

Inicialmente o autor conceitua a intimidade/ amizade íntima como uma relação emocional onde há um bem-estar mútuo, revelação de assuntos particulares, envolvendo ou não os sentidos, e presença de interesses e atividades em comum.

Contudo, segundo o autor, para que haja a expressão de assuntos íntimos é preciso um exercício de auto-conhecimento. Apesar de ser um exercício particular, a percepção do próprio corpo e da aparência física vai sendo construída com influência do que os outros nos atribuem e dos padrões estéticos. Por outro lado a construção da identidade e o conhecimento de si vão ser importantes para o desenvolvimento da amizade baseada na intimidade.

Cordeiro levanta a possibilidade de que, o fato da amizade mais íntima se tornar comum na fase estudada ocorre devido à segurança que os adolescentes encontram, mais em seus pares do que nos adultos, para revelar seus assuntos individuais, compartilhar valores, objetivos e idéias.

O autor considera determinantes para essas mudanças nas relações alguns aspectos como: a puberdade, o desenvolvimento da capacidade de pensamento – principalmente no domínio do conhecimento social. Essas transformações, porém, ocorrem de maneiras distintas entre o sexo feminino e o masculino. Considerando que a as meninas já têm recursos que lhes permitem expressar sua intimidade, não descrevendo que recursos são esses. Os rapazes se equiparam a elas quando chega à fase adulta.

Com base no seu conhecimento e uma breve literatura sobre o tema, Cordeiro elege, em seu estudo, um objetivo geral de investigar a relação entre a percepção sobre a aparência física e a amizade íntima na adolescência. Ele elabora também três objetivos específicos: avaliar a percepção da aparência e o nível de desenvolvimento da relação de amizade íntima em cada sexo e identificar a diferença entre eles. Desta forma, tem como hipótese que haveria esta diferença entre as moças e rapazes, bem como seria distinta a forma que a percepção sobre si exerce influência no estabelecimento de relações íntimas.

Para realização deste estudo, participaram 309 alunos e alunas pré-universitárias com idade média de 18 anos. Com o objetivo de avaliar a amizade íntima foi escolhida a escala “Intimate Friendship Scale” (Sharabany, 1994, 2000) sob duas formas, O Meu Melhor Amigo e A Minha Melhor Amiga, com oito dimensões: sinceridade e espontaneidade; sensibilidade e conhecimento mútuo; comportamentos de vinculação; exclusividade relacional; dádiva e partilha; imposição; atividades comuns e confiança e lealdade. Já para avaliação do auto-conceito foi aplicada a escala “The self-perception profile for college students” (Neemann & Harter, 1986), com sete dimensões: aparência física, amizades íntimas, aceitação social, relação com os pais, relações amorosas, humor, moralidade, apreciação global.

A partir dos resultados, constatou-se que com relação à Amizade Íntima o sexo feminino tem um grau mais elevado que o masculino. Para o autor isto acontece devido à afirmação precoce da identidade nas meninas, o que faz com que já tenham formado suas posturas nas relações. Ainda na escala de Amizade Íntima a dimensão Confiança e Lealdade obteve maior valor médio, o que para o autor, indica que os jovens primam por amizades que possam partilhar segredos e que não haja traição.

Quanto a Amizade Íntima com o Melhor Amigo, a dimensão Atividades em Comum foi a única que pouco difere entre os sexos. O autor acredita que os rapazes consideram estas atividades o componente mais importante para a amizade, enquanto que as meninas valorizam este e outros pontos. Com relação à Melhor Amiga houve consenso, entre os sexos, nas dimensões Amizade Íntima, Vinculação, Confiança e Lealdade. Os resultados semelhantes quando se trata das relações com o sexo feminino foi explicado como resultante da identificação por parte das meninas e, para os rapazes seria uma necessidade de afirmação da sua masculinidade perante o sexo

Contatou-se que a Percepção do Auto-conceito foi elevada no geral, sendo os valores maiores no sexo masculino do que no feminino, bem como a dimensão Percepção sobre Aparência Física. Apenas esta sub-escala e a Apreciação Global obteve diferenças estatisticamente significativas entre os sexos.

Acerca das relações entre a Percepção sobre Aparência Física e a Amizade Íntima não houve correlações significativas. Apesar disso, notou-se que todas as correlações são negativas no sexo masculino e no total, porém no sexo feminino isto ocorreu apenas em Percepção sobre Aparência Física e Amizade Íntima com a Melhor Amiga. Os valores, apesar de não significativos, indicam uma tendência para quanto maior a auto-percepção menor a amizade íntima.

O autor é mestre na área de Saúde, formado em enfermagem, e aparenta ter apenas um breve conhecimento quanto às questões psicológicas que envolvem o assunto. Assim o artigo, apesar de publicado na revista Análise Psicológica, não traz discussões profundas. Entretanto o estudo abre espaço para reflexões sobre os dados e posteriores estudos para obter convicção da relação proposta.

O artigo nos remete a idéia de que talvez, entre a percepção de si e as relações de amizade na adolescência, haja uma relação recíproca onde uma influencia a outra, ao contrário da relação unidirecional proposta pelo autor – apesar de os dados não serem estatisticamente significativos e, portanto não asseguram nenhuma correlação. Como afirmam alguns psicólogos sociais, há a existência da vida social anterior a consciência de si que a influencia. Por outro lado, os adolescentes têm seu papel ativo na formação de sua auto-percepção que vai interferir, por sua vez, nas suas relações.

Referência: Cordeiro, R. Aparência física e amizade íntima na adolescência: Estudo num contexto pré-universitário Análise Psicológica, 4, 509-517, 2006.

Notícia do dia: para especialistas, preconceito incentiva e facilita o tráfico de pessoas

As consequências do preconceito se manifestam em vários níveis e nos mais diversos domínios. Nas palavras de Thaís Dumet, coordenadora do projeto de Combate ao Tráfico de Pessoas da OIT, “temos uma sociedade machista, adultocêntrica e preconceituosa. O tráfico de pessoas é objeto de preconceito porque atinge mulheres, negros, pobres, crianças, e a população segregada socialmente”. Clique aqui para ler a reportagem publicada no UOL.

Resenha: A expressão das formas indirectas de racismo na infância

Contribuição: Aruanã Fontes

O racismo tem se tornado cada vez mais indireto, discreto e sutil na sociedade contemporânea. Assim, buscam-se atenuar as expressões explícitas do preconceito, substituindo-as por novas formas que não evidenciem seu caráter discriminatório. Vários estudos na área da psicologia social têm se debruçado sobre este tema para descrevê-lo ou constatar as suas causas, entretanto normalmente focam nos adultos. França e Monteiro contemplam este assunto, direcionando seus estudos para as novas expressões do racismo, porém na infância. As autoras, no artigo, buscam confrontar as teorias cognitivas do desenvolvimento que consideram que a partir dos 7 ou 8 anos as crianças – devido ao desenvolvimento das capacidades cognitivas – se tornam menos preconceituosas. Para isso elas fazem uma breve revisão da literatura acerca da discriminação sutil em adultos, a fim de aproximar estes conceitos da realidade das crianças. Dentre as abordagens apontadas, a teoria do racismo aversivo de Dovidio e Gaertner merece destaque. Esta teoria afirma que as expressões de racismo dependem do contexto de resposta. Assim, nos meios em que o socialmente esperado não se faz claro, ou que há uma justificativa para a discriminação, o racismo se faz evidente. Gaertner concluiu que a saliência da norma anti-racista faz com expressões de racismo sejam evitadas. Esta justificativa, para França e Monteiro, serve também para o fato de as crianças acima de 8 anos começarem a reduzir ou extinguir suas manifestações de discriminação. Para as autoras a partir desta idade já há interiorização das normas sociais anti-racista, e o discernimento dos locais em que pode ou não discriminar as outras crianças. França e Monteiro elaboram três estudos com crianças brancas, com uma quantidade balanceada de crianças entre 8 e 10 anos e entre 5 e 7 anos, para comprovar que as primeiras já se assemelham aos adultos no que diz respeito a expressão discreta do racismo. Vale salientar que todas tinham capacidade de realizar e entender as tarefas requeridas. No primeiro estudo foi dada uma instrução na qual cada criança teria que recompensar duas crianças-alvo (uma negra e uma branca) por ter ajudado em uma tarefa, carregando tijolos – historia fictícia. O contexto poderia ser: igualitário – os alvos com o mesmo desempenho na tarefa –, o qual comporta justificação para a discriminação; ou contexto de diferenciação – o alvo negro com menor desempenho que o branco ou vice-versa – onde a discriminação era justificável. A discriminação seria, então, detectada através da distribuição dos doces em cada contexto. As autoras confirmaram as hipóteses de que: no geral o alvo Negro seria discriminado; as crianças menores o discriminariam em qualquer contexto e as maiores apenas no contexto em que havia justificativa para tal. O segundo estudo foi realizado em escolas onde cada criança participava de uma entrevista. Uma entrevistadora negra dava notas de brinquedo à criança para que as distribuíssem para duas crianças em fotos – uma branca e uma negra – dizendo que estas notas seriam revertidas em dinheiro real, para ajudar as crianças a comprarem suas bicicletas. Este estudo procurava testar o impacto do nível de saliência da norma anti-racista – representada pela presença ou ausência da entrevistadora – na discriminação – observada através da quantia de dinheiro que destinada aos alvos. Constatou-se que, como esperado, as crianças mais novas discriminaram o alvo negro independente da saliência da norma, ou seja, estando a entrevistadora presente ou não. Já no grupo de crianças mais velhas, houve discriminação somente no contexto onde a norma anti-racista não era saliente, no qual a entrevistadora tinha se retirado. Para investigar o período da infância no qual já existi a interiorização das normas contra o racismo, foi elaborado um terceiro estudo com um grupo de crianças e de mães. Foi mostrada, então, uma lista com 11 grupos (doentes de SIDA, homossexuais, índios, condutores de risco, negros, cegos, pessoas feias, gordas, racistas, pessoas sujas e políticos). Para as mães foi perguntado o quanto era normal ter sentimentos negativos com relação a cada grupo, e para as crianças o quanto elas gostavam destes. As escalas para os dois grupos iam de 1 (acha certo – para as mães – ou gosta – para as crianças) a 3 – o extremo oposto. Os resultados mostraram que os grupos os quais as mães achavam mais aceitável o preconceito, as crianças de todas as idades mostravam discriminação com relação a estes. Contudo, com relação ao grupo de negros, as mães não consideram permitido o preconceito e as crianças de 5 a 7 anos os discriminaram. Porém, as mais velhas revelaram sentimentos positivos com relação ao grupo focado, se mostrando compatíveis com as normas do seu grupo de referência. A partir dos estudos, pode-se constatar que as crianças a partir dos 8 anos já interiorizaram, pelos menos parcialmente, as normas anti-racistas. Ao contrário do que a teoria cognitiva do desenvolvimento afirma, elas não deixam ter preconceitos, e sim driblam as regras sociais. Assim, em contextos onde essas regras não estão salientes ou em que há justificação para a discriminação, que não a racial, elas se mostram racista. Estudos como estes tem grande relevância, pois ao verificar expressões indiretas de racismo na infância devemos mudar nossas práticas com relação às crianças, ou seja, os estudos implicam em uma transformação na maneira de ver os comportamentos delas. Nas escolas, por exemplo, é preciso estar atento as relações entre as crianças, já que, muitas vezes, quem percebe as formas sutis são apenas aquelas que sofrem com o racismo. Estas formas são muitas vezes tidas como exagero da vitima, o que vai interferir na formação de sua identidade racial.

Referência França, D. X. e Monteiro, M. B. (2004). A expressão das formas indirectas de racismo na infância. Análise Psicológica. Vol. 4 (22): 705-720.

Resenha: a expressão das formas indiretas de racismo na infância

Contribuição: Gilcimar Dantas

Estudos que analisam preconceitos em crianças afirmam que estas se tornam menos preconceituosas após os sete anos de idade a partir do amadurecimento de estruturas cognitivas já existentes. Entretanto, há uma contradição entre a diminuição do preconceito a partir do sete anos de idade e atitude preconceituosas dessas mesmas pessoas quando adultas. Sendo assim, em contraposição à abordagem cognitiva do desenvolvimento, França e Monteiro buscam demonstrar, por meio de uma pesquisa realizada em escolas públicas e privadas do Brasil, que a expressão do preconceito não diminui, mas apenas modifica a sua forma de se manifestar tornando-se menos direta. Para tanto, foram realizados três estudos no intuito de avaliar o efeito da saliência nas formas de expressão de racismo na infância e o processo de socialização da norma anti-racista em dois grupos de idade – crianças entre cinco e sete nãos e entre oito e dez anos. No primeiro estudo procurou-se investigar as formas indiretas de racismo em contextos aonde a discriminação poderia ser justificável e em outro no qual a discriminação não poderia ser justificável nos dois grupos de idade. As crianças foram entrevistadas individualmente, tendo como estímulo fotografias de crianças negras e brancas, e ainda quatro pequenos tijolos e seis doces de brinquedo. Durante a entrevista, era contada à criança uma história a qual ela estava querendo construir uma casa (para as meninas) ou uma garagem de brinquedo (para os meninos) e que seria necessária a ajuda de crianças que ganhariam doces como recompensas. Os tijolos eram usados para representar o quanto cada criança da fotografia, branca ou negra, havia carregado. Numa situação o alvo branco carregava mais que o alvo negro e numa outra o alvo negro carregava mais que o alvo branco, sendo que após o somatório final, ambos tinham carregado a mesma quantidade de tijolos. Os resultados indicaram que no contexto em que se justificava a discriminação as crianças mais novas recompensavam mais o branco, ao passo que as mais velhas eram igualitárias. Já no contexto em que a discriminação não era justificada ambos os grupos recompensavam mais o branco. No segundo estudo foi utilizada uma entrevistadora negra a fim de manipular um contexto onde uma norma anti-racista estivesse muito ou pouco saliente. Este estudo teve como objetivo verificar se a presença da entrevistadora negra influenciaria na expressão do racismo entre os dois grupos de idade. As crianças foram abordadas em sala de aula tendo sido entrevistadas individualmente. A entrevistadora contava uma história de duas crianças, uma negra e uma branca, que precisavam de contribuições para comprar bicicletas. Havia diante dos entrevistados dois mealheiros, trancados com cadeado, um com a foto da criança negra e outro com a da criança branca, aonde os entrevistados colocariam as suas contribuições (cédulas de brinquedo de um real) na quantia que desejassem. Os resultados desse estudo indicaram que houve discriminação do alvo negro por parte das crianças, sendo que quando a entrevistadora estava presente as crianças entre dez e oito anos contribuíam de maneira igualitária ao contrário do que faziam quando a entrevistadora não estava. Por outro lado, as crianças entre cinco e sete anos contribuíam menos à criança negra estando a entrevistadora na sala de aula ou não. Partindo do pressuposto de que a prática do racismo sutil está ligada às pressões da norma anti-racista, o terceiro estudo teve como objetivo verificar a partir de que idade as crianças interiorizavam essa norma através dos adultos. Participaram dessa pesquisa quinze crianças brancas e quinze mães também brancas. Neste trabalho foi utilizada uma lista com onze grupos (negros, pessoas racistas, homossexuais, índios, portadores do vírus da AIDS, motoristas barbeiros, cegos, pessoas feias, racistas, gordas, sujas e políticos) sobre os quais as crianças eram solicitadas a dizerem através de uma escala, que variava entre 1 (muito), 2 (talvez) e 3 (nada) o quanto gostavam de cada pessoa pertencente aos grupos listados. Lembrando que as escalas só foram aplicadas em crianças que foi verificado o seu conhecimento sobre o significado de cada um dos grupos listados. As mães, por sua vez, respondiam a uma escala que se referiam a esses mesmos onze grupos, que variava entre 1 (não está certo ter sentimentos negativos em relação a esse grupo), 2 (talvez esteja certo) e 3 (está certo ter sentimentos negativos em relação a esse grupo). Os resultados deste estudo demonstraram que os grupos alvo de preconceito por parte das mães foram políticos, pessoas racistas e homossexuais. As crianças entre cinco e sete anos se diferenciaram de suas mães apresentando preconceito relativo ao grupo dos negros enquanto que entre as crianças de dez a oito anos não houve essa diferenciação. Ou seja, elas não apresentaram preconceito contra negros, assim como fizeram as suas mães. Os resultados dessa pesquisa põem em questão a afirmação meramente cognitivista de que as crianças, ao se tornarem mais velhas, por já terem atingido a fase da descentração, seriam capazes de perceber a diferenciação no interior de cada categoria levando-as a agirem de maneira menos estereotipada. Para as autoras, a grande causa para esse tipo de comportamento seria a interiorização das normas sociais do racismo sutil e a capacidade de geri-las de acordo com o contexto. Não se pode esquecer também, que como se trata de uma pesquisa realizada em escolas brasileiras, não se deve perder de vista, também, os efeitos da democracia racial na qual a expressão do racismo se dá de maneira velada e cordial indo para além da interiorização de normas sociais anti-racistas por questões politicamente corretas. No Brasil, a expressão do racismo se torna sutil no intuito de “demonstrar” que todos os brasileiros são iguais racialmente e de que não há necessidade de se buscar mudanças sociais nesse campo. Referência França, D. X. e Monteiro, M. B. (2004). A expressão das formas indiretas de racismo na infância. Análise Psicológica. Vol. 4 (22): 705-720.

Foto do dia: Brazilian Monday…

Brazilian Monday…, originally uploaded by carf.

Foto do dia: Ageism doesn’t belong in the 21st century

Resenha: Estereótipos sobre idosos: uma representação gerontofóbica

Elisa Maria Araújo

O artigo “Estereótipos sobre idosos: uma representação gerontofóbica” aborda a discussão sobre o uso primordial dos estereótipos para a percepção de outros seres humanos. Define os estereótipos como uma percepção extremamente simplificada, que se caracteriza por ser um modelo lógico para resolver uma contradição da vida cotidiana. Martins e Rodrigues (2004) introduzem, no entanto, que os estereótipos contribuem para o não reconhecimento da unicidade do indivíduo, e conseqüentemente, para o despotismo em determinadas situações. Por se tratar de um constructo categorial, generalizador, estável e definidor de um grupo social, o artigo apresenta que a literatura científica sobre os estereótipos é prolixa.

Dentro dos estudos apresentados neste presente trabalho, há a vertente que entende que os estereótipos são pré-concepções rígidas, podendo ser falsas e irracionais. Dentre os diversos domínios da vida social em que os estereótipos são utilizados, este artigo se volta a analisar os estereótipos que envolvem os idosos. Neste caso, a valorização dos estereótipos sobre a velhice gera uma representação social gerontofóbica. Isso acontece quando o fenômeno de envelhecer passa a ser tratado como prejudicial, de menor utilidade ou associado à incapacidade funcional. De acordo com Nogueira (1996, apud Martins e Rodrigues, 2004), os preconceitos envolvem geralmente crenças, de que o envelhecimento torna as pessoas senis, inativas, fracas e inúteis. O desenvolvimento de rejeição e rotulagem de um grupo, em particular de indivíduos, ocorre porque as características individuais com traços negativos são atribuídas a todos os indivíduos desse grupo.

O artigo utiliza a palavra “velhote”, que descreve os sentimentos ou preconceitos resultantes de micro-concepções e dos “mitos” acerca dos idosos, como forma de exemplificar os estereótipos que se referem aos idosos. Da mesma maneira, a velhice remete a uma representação de uma doença incurável, como um declínio inevitável, que está votado ao fracasso. Este estereótipo tornou-se tão socialmente aceito que Louise Berger (1995, apud Martins e Rodrigues, 2004) afirma que abundam hoje “idéias feitas e preconceitos relativamente à velhice. Os ‘velhos’ de hoje, os ‘gastos’, os ‘enrugados’ cometeram a asneira de envelhecer numa cultura que deifica a juventude”.

Em seguida, as autoras reservam um espaço do trabalho para fazer esclarecimentos específicos sobre os conceitos de atitudes, crenças e estereótipos. De forma sucinta, objetiva e pouco embasada em autores e estudos anteriores, elas definem atitude como sendo “conjunto de juízos que se desenvolvem a partir das nossas experiências e da informação que possuímos das pessoas ou grupos”, podendo ser favorável ou desfavorável, além de exercer influência nos comportamentos. Além disso, definem crença como “um conjunto de informações sobre um assunto ou pessoas, determinante das nossas intenções e comportamentos, formando-se a partir das informações que recebemos”. Como exemplo, as autoras se utilizam da “idéia” de que todos os idosos são sensatos, dóceis e nunca se zangam. E por fim, conceitualizam estereótipo como sendo uma imagem mental muito simplificada que é partilhada, nas suas características essenciais por um grande número de pessoas. Seria um “chavão”, uma opinião feita, uma generalização e simplificação de crenças, podendo ser de natureza positiva ou negativa. A idéia de que todos os idosos são prudentes seria um exemplo de um estereótipo positivo, na qual são atribuídas características positivas ao grupo; e ao contrário, a crença de que os idosos são senis, representa uma forma de estereótipo negativo.

Baseando-se em estudo da Universidade de Montreal por Champagne e Frennet (cit. por DINIS, 1997, apud Martins e Rodrigues, 2004), o artigo identifica quatorze estereótipos considerados como os mais freqüentes relativos aos idosos. Importante ressaltar, que o artigo não faz nenhum comentário sobre como se deu este estudo, com quem foi realizado e quando aconteceu, e isso se mostra uma grande limitação do artigo em discussão. Simplesmente apresenta os resultados, analisando-os superficialmente.

Dentre os estereótipos mais freqüentes, a maioria destes não tem relação a características específicas do envelhecimento, mas sim a traços da personalidade e a fatores socioeconômicos. Como estereótipos mais freqüentes, foram encontrados que: os idosos não são sociáveis e não gostam de se reunir; temem o futuro; são pessoas doentes que tomam muita medicação; fazem raciocínios senis; são muito sensíveis e inseguros; não se interessam pela sexualidade; divertem-se e gostam de rir; gostam de jogar às cartas e outros jogos; gostam de conversar e contar as suas recordações; gostam do apoio dos filhos; não se preocupam com a sua aparência; são muito religiosos e praticantes; são frágeis para fazer exercício físico; são na grande maioria pobres.

Este resultado revela que se de um lado os estereótipos simplificam a realidade, por outro, minimizam as diferenças individuais entre os membros de um determinado grupo, o que revela um desconhecimento do processo de envelhecimento. Além disso, a utilização de estereótipos é causa de enorme perturbação nos idosos, uma vez que estes negam o seu processo de crescimento e os impedem de reconhecer as suas potencialidades, de procurar soluções precisas para os seus problemas e de encontrar medidas adequadas.

Por fim, a visão global e generalizada, que caracteriza os estereótipos gerontológicos, distorce a realidade. O artigo conclui sua análise com a reflexão de que investigações diversas sobre esta temática têm demonstrado que a distorção causada pelos estereótipos “cegam” os indivíduos, impedindo-os de se precaverem das diferenças que existem entre os vários membros, não lhe reconhecendo deste modo, qualquer virtude, objeto ou qualidade.

Além disso, o artigo apresenta influências que a enfermagem sofre e que são determinantes para a prática de comportamentos positivos e negativos desses profissionais. De acordo Berger (1995, apud Martins e Rodrigues, 2004), respeito, a reciprocidade e a confiança são exemplos de atitudes positivas que os profissionais de enfermagem podem ter diante das influências do meio e do social; e “automorfirmo social”, “gerontofobia”, “âgismé” e a infantilização ou “bebeísme” são exemplos de atitudes negativas quanto aos idosos. Estas atitudes negativas são respectivamente: o não reconhecimento da unicidade do idoso; o medo irracional de tudo quanto se relaciona com o envelhecimento e com a velhice; todas as formas de discriminação, com base na idade; e simplificação demasiada das atividades sociais e/ou recreativas e pela organização de programas de atividades, que não correspondem às necessidades dos indivíduos.

O artigo termina com a mesma análise superficial com a que começou. Apresenta uma visão geral de como os estereótipos referente aos idosos geram influências na vida dos idosos, e no comportamento das pessoas frente a estas pessoas. Faz reflexões sobre o quanto se perde e se ganha com a utilização dos estereótipos, porém não aprofunda em nenhuma discussão. Durante toda a discussão, faz-se pouca referência a estudos e pesquisas anteriores sobre o tema, o que mostra grande limitação do texto em questão.

Resenha: Martins, R. M. e Rodrigues, M. L. Estereótipos sobre idosos: uma representação social gerontofóbica. Millenium. Revista do ISPV, 29, 249-254, 2004.

Office Stereotypes- The 40 Year Old Virgin

Estereótipos e aparência física: pode bater?

Fonte: CQSabe