Resenha: Usuários de drogas injetáveis e terapia anti-retroviral: percepções das equipes de farmácia

Rafael Raposo

O uso de droga injetável (UDI) foi responsável por 21,5 % de casos HIV/AIDS entre 1980 e 2005 no Brasil. Um dos instrumentos de prevenção contra a contaminação de HIV/AIDS é a terapia anti-retroviral (ARV). A adesão à terapia anti-retroviral é o caminho para o controle deste problema de saúde pública. No entanto, para que ocorra o controle é necessário disponibilizar serviços de qualidade através de uma equipe multiprofissional na promoção de adesão.
Os farmacêuticos fazem parte da equipe multidisciplinar, pois pode contribuir para a inclusão e para disponibilizar melhorarias a qualidade de vida dos usuários, pois a representação social interligada aos UDI está diretamente ligada à negação dos usuários a adesão por conta das drogas. Por conta disso, a equipe multiprofissional poderia contribuir para a diminuição da discriminação e da estigmatização que atualmente colocam os UDI num patamar de exclusão e ‘invisibilização’ social.
Por conta disso, o artigo que esta resenha se baseou foi “Usuários de drogas injetáveis e terapia antirretroviral: percepções das equipes de farmácia”, de autoria de Chizuru YokaichiyaI, Wagner FigueiredoII e Lilia SchraiberIteve, publicado em 2007. O principal objetivo deste artigo foi compreender como as equipes de farmácia lidam com os pacientes UDI, e os respectivos problemas que estas equipes encontram para oferecer ações em prol da melhoria da adesão ao tratamento ARV.
Foi efetuado um estudo qualitativo formado por grupos focais que tinham como objetivo fazer uma análise temática dos discursos oriundos dos farmacêuticos, técnicos e auxiliares com uma experiência em unidades assistenciais de DST/AIDS em São Paulo. Os grupos afirmaram que a farmácia tem um papel fundamental para a adesão ARV, pois a partir da sua intervenção são criados laços de confiança entre o paciente e a equipe multidisciplinar. Outro ponto a ser destacado é que os usuários de drogas injetáveis “os pacientes mais complicados” são tratados como qualquer outro paciente das unidades assistenciais, mas o que pode dificultar a relação deles com estes pacientes é a excessiva burocracia que envolve as suas atividades.
Uma das atividades disponibilizadas aos UDI é a troca de seringas (seringas, agulhas descartáveis, lenços anti-sépticos, copo plástico, água estéril e preservativos) do Programa Redução de Danos. A participação dos profissionais de farmácia neste programa é de extrema importância para a prevenção do HIV/AIDS, mas muitos integrantes dos grupos focais não concordam com a prática deste programa. Muitos deles afirmam que no final das contas acaba faltando seringas para outras atividades nas unidades assistenciais.
Contudo, os profissionais de farmácia apontam algumas sugestões para proporcionar melhorias para o atendimento interdisciplinar: elaborar um controle de participação dos pacientes para detectar os faltosos, conseguir controlar os medicamentos do paciente adequando-os conforme o estilo de vida do paciente e facilitar o diálogo entre o paciente e a equipe de saúde. O texto conclui que não se pode achar que dar medicações é o suficiente, pois esta é uma ferramenta – entre inúmeras – utilizada em prol do bem-estar social do paciente.

Referência: Yokaichiya CM, Figueiredo WSF, Schraiber LB. Usuários de drogas injetáveis e terapia anti-retroviral: percepções das equipes de farmácia. Rev Saúde Pública 2007; 41 Suppl 2:14-21.

Resenha: processos cognitivos, cultura e estereótipos sociais

Rafael Raposo

No correria da vida contemporânea o homem vive a fazer escolhas, e até juízos de valor, que muitas vezes passam despercebidas por ele. Por esta razão, Water Lippmann se preocupou em compreender como as representações da realidade social são construídas pelas pessoas. Como as pessoas se situam no mundo? Como organizam as inúmeras informações que dispõem? Porque se apegam a algumas informações e desprezam outras? Para entendermos estas questões é de suma importância conhecer o trabalho de Walter Lippmann: um dos primeiros teóricos a fazer uma reflexão sistemática sobre os estereótipos.
Este teórico afirma que as representações guiam o indivíduo e o auxiliam quando ele precisa lidar com informações complexas, entretanto, estas representações funcionam também como defesas que possibilitam ao mesmo proteger os seus valores, os seus interesses, as suas ideologias. Nesta ótica, as representações não possuem uma posição neutra, pois sofrem uma influência maior do observador do que do objeto propriamente dito.
Lippmann também tenta compreender de que modo à cultura influencia no recorte que o indivíduo faz da realidade, e de que forma estes recortes ganham consistência e estabilidade de significado. Devido a isso, o autor analisa o papel dos preconceitos para a utilização da informação a partir da interpretação da realidade, da memorização e recuperação das informações.
Paralelo a isso, Lippmann analisa a função dos estereótipos na representação da realidade do indivíduo. O teórico define os estereótipos como imagens mentais que auxiliam os indivíduos no processamento da informação que fica delimitado entre o indivíduo e a realidade. Assim, os estereótipos sofrem forte influência do sistema de valores do indivíduo, tendo como função a organização e estruturação da realidade.
Um exemplo para ilustrar como os estereótipos influenciam a representação da realidade do indivíduo (estereótipos individuais), e também pode ficar a mercê das influências culturais (estereótipos sociais), é o estudo de Katz e Braly (1933, citado por Cabecinhas, 2004) em que foi pedido a 100 estudantes universitários para apontarem cinco traços típicos de cada um dos dez grupos-alvo expostos. Aos americanos brancos foram apontadas características positivas (empreendedores, inteligentes, materialistas, ambiciosos e progressistas) totalmente interligadas ao sonho americano propagado na época do estudo, enquanto os americanos negros foram incluídos em categorias negativas (supersticiosos, preguiçosos, despreocupados, ignorantes e musicais) totalmente contrárias aos valores que o “sonho americano” reforçava. Através deste resultado o estudo pode apontar uma das inúmeras variáveis que apontam o motivo da exclusão social que os negros sofriam na época.
Nesse sentido Karlins (et al., 1969 citado por Cabecinhas, 2004) enfatizam a importância da distinção entre os estereótipos pessoais (psicológicos), e os estereótipos sociais (culturais). Os autores defendem que se por um lado os estereótipos culturais dos negros são negativos, as crenças pessoais (estereótipos pessoais) são positivas. Muitos participantes demonstraram uma opinião de apoio aos negros.
Entretanto, mesmo afirmando que os estereótipos funcionam de forma inevitável, Lippmann propôs uma educação crítica para que os indivíduos se conscientizarem do caráter subjetivo que a sua apreensão da realidade possui. Portanto, é de suma importância conhecer o trabalho inovador de Lippmann – seus êxitos e as lacunas deixadas pela sua teoria – para que os pesquisadores sobre estereótipos possam desenvolver novas pesquisas que possibilitem uma melhor compreensão sobre os estereótipos.

Referência Bibliográfica
CABECINHAS, R. (2004). Processos cognitivos, cultura e estereótipos sociais. Actas do II Congresso Ibérico de Ciências da Comunicação, Universidade da Beira Interior, Covilhã, 21-24 de Abril.

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